História de MT
Os últimos momentos do mato-grossense, Batistas das Neves, capitão da Marinha, morto por machadinha na Revolta da Chibata
O comandante, Batista das Neves, ao tentar coibir a revolta dos marujos, é empurrado e esmurrado por dois deles e é morto
Era por volta das 22:15 hs, uma segunda feira, do dia 22 de novembro de 1910 e o tempo na Baía da Guanabara, no estado Rio de janeiro, estava ameno.
Dentro do navio, encouraçado Minas Gerais, atracado na Baía, o vento variava entre 4 a 6 nós e indicava velocidade leve, contudo agradável.
Seu comandante, o capitão de mar e guerra, o mato-grossense natural da cidade de Diamantino(181,1 KM de Cuiabá), João Batista das Neves, tinha recentemente retornado ao encouraçado – considerado, na época, o maior navio de guerra brasileiro – em companhia do seu ajudante de ordem, o 2º tenente Armando Figueira Trompowsky de Almeida, depois de terem ido jantar no cruzador francês Douguay-Trouin, uma recepção oferecida em homenagem ao capitão mato-grossense.
Ao subir no navio Minas Gerais, Batista das Neves, conversou rapidamente com o primeiro tenente Álvaro da Costa e que fiscalizava a limpeza do convés, e com o segundo-tenente, Mota Silva, que era o oficial de plantão do dia. E logo após, Batista das Neves se recolheu aos seus aposentos.
O 2º tenente Armando Figueira Trompowsky de Almeida, após a retirada de seu capitão, também foi descansar.
Instantes após ter se despedido do capitão, o oficial de serviço, tenente Mota e Silva foi, supreendentemente, atacado por um marujo no momento em que descia as escadas inferiores do navio. Ele recebeu um golpe da baioneta.
O tenente lutou contra o marujo e segurou sua baioneta. No contragolpe sacou sua espada e lhe desferiu um golpe certeiro no abdômen.
O golpe da baioneta foi tão profundo que o marujo contorceu-se de dor e começou a gritar, chamando a atenção de toda a tripulação do Minas Gerais, entre eles o capitão, Batista das Neves, e dos marinheiros do encouraçado.
Atraídos pelos gritos, os marinheiros e os oficiais subiram ao convés. Era 22:55 hs daquele dia.
Os dois grupos começaram a gritar um com os outros.
Da parte da marujada, eles gritavam: viva a liberdade e abaixo a chibata(castigo imposto aos marinheiros pretos e pardos) que cometiam supostamente desrespeito ao código e valores da Marinha, na época.
Do lado do oficialato, eles defendiam o respeito e a hierarquia.
Os ânimos se exaltaram e os cerca de oitocentos marinheiros atacaram o pequeno grupo de oficiais que estavam no convés.
O comandante, Batista das Neves, ao tentar coibir a revolta dos marujos, é empurrado e esmurrado por dois deles.
Ao tentar se defender, ele saca sua espada e luta bravamente por cerca de dez minutos, mas é atingido por trás com golpes de machadinhas na cabeça, desferida por um marinheiro mulato e tem morte instantânea.
Cinco oficiais também são atingidos e morrem no encouraçado, entre eles: O 2º tenente Armando Figueira Trompowsky de Almeida e o tenente Mota e Silva. Pelo lado dos marinheiros houve duas mortes, e vários feridos, uns defendendo os oficiais outros lutando do lado dos marujos.
Após terminado os combates no convés do Minas Gerais, o líder da revolta, o marinheiro de 1ª classe João Cândido Felisberto, gaúcho da cidade de Encruzilhada do Sul(2.148,5 KM de Cuiabá) determina que seja disparado um tiro de canhão para alertar aos outros navios de guerra: O cruzador rápido República, cuja tripulação ao receber o alerta, abandona a embarcação e embarcar nos demais navios envolvidos na revolta, o Bahia, o Minas Gerais e o São Paulo.
Por ordens dos líderes da revolta, o cadáver do Comandante Batista das Neves ficou exposto no convés durante várias horas sendo alvo de chacotas.
Tal atitude, ocorre como forma de vingança pelo tratamento dado aos marujos e aos exercícios forçados que o comandante obrigava há todos cumprirem diariamente.
O marinheiro Aristides Pereira, ao se certificar do falecimento do comandante Batista das Neves, urinou sobre o seu cadáver ainda no convés.
O estopim para a revolta no Minas Gerais sob o comando do capitão, João Batista das Neves, foi ordenar que o marinheiro Marcelino Rodrigues Menezes levasse 250 chibatadas. Marcelino teria entrado com duas garrafas de pinga escondido a bordo.
Ele foi denunciado pelo cabo Valdemar Rodrigues de Souza.
Logo após a denúncia, Marcelino aplicou um golpe de navalha no rosto do Cabo Valdemar, causando um corte profundo.
Após a agressão ao cabo, que quase lhe causou a morte, e por ter entrado com cachaça a bordo, o capitão Batista das Neves mandou aplicar 25 chibatadas, mas foi o total aumentado para 250 pelos próprios militares.
Mas, os descontentamentos dos cerca de 90% dos marinheiros negros, mulatos ou mestiços recrutados à força entre as camadas mais pobres da sociedade, muitos retirados das prisões, eram a continuidade das chibatadas para os castigos dos marujos.
A prática tinha sido abolido, após a proclamação da republicam, mas, através do decreto nº 328 do dia 12 de abril de 1890, a Marinha reintroduziu a chibata, através da chamada Companhia Correcional, na qual eram enquadrados os marinheiros considerados “indisciplinados”.
Seu artigo 8º determinava: “Para as faltas leves, prisão e ferro na solitária, a pão e água; faltas leves repetidas, idem, idem por seis dias; faltas graves, 25 chibatadas.”
João Candido na época marinheiro de 1ª classe e centenas de outros marujos, tinha – anteriormente – sido enviados pela Marinha em 1908 para os estaleiros de New Castle, na Inglaterra, onde passaram a conviver com marinheiros de todo o mundo e tiveram contato com as ideias avançadas da classe operária europeia.
New Castle, na Inglaterra, estava construindo para o Governo do Brasil, dois grandes encouraçados – o Minas Gerais e o São Paulo – três cruzadores, seis contratorpedeiros, seis torpedeiros, seis torpedeiros menores, três submarinos e um navio carvoeiro, tornando-se a terceira mais poderosa marinha de guerra do mundo.
Ao chegar ao Brasil, no início de 1910, João Cândido passou a articular a revolta, junto com Francisco Dias Martins, o “Mão Negra”, tendo como principais reivindicações a abolição da chibata, a melhoria da alimentação e a elevação dos soldos. Inicialmente, a revolta foi marcada para o dia 15 de novembro de 1910, mas um forte temporal nesse dia fez com a mesma fosse adiada para 24 ou 25 de novembro.
Mas, as chibatadas no marujo Marcelino, foi o estopim para a eclosão da Revolta. No mesmo dia após a tomada do Minas Gerais às 23:00 hs, e sob a liderança de João Cândido, 2.379 marinheiros — em sua maioria, negros e pardos — assumiram o comando de outros navios de guerra — São Paulo, Bahia e Deodoro —, que estavam ancorados na Baía de Guanabara.
Os navios apontaram 80 canhões na direção do Rio de Janeiro e ameaçou bombardear a então capital da República, caso suas exigências não fossem cumpridas: melhores salários, anistia aos revoltosos e, principalmente, o fim dos castigos.
Foram cinco dias de motim e que deixou vários mortos e feridos.
Pressionado por políticos da oposição, o recém-empossado presidente da República, o marechal Hermes da Fonseca, aceitou as condições e pôs fim à rebelião.
Ele determinou ao deputado federal pelo Rio Grande do Sul – e ex-comandante da Marinha, José Carlos de Carvalho, para que fosse ao Minas Gerais negociar com os revoltosos.
Sob João Candido, os marinheiros aceitaram as promessas do Governo Federal.
A trégua, porém, durou pouco, pois no dia seguinte, logo que os rebelados começaram a desembarcar, Hermes da Fonseca voltou atrás.
E, por decreto, começou a perseguir todos os que participaram do levante. Dos 2.379 marujos revoltosos, 1.216 foram expulsos da Marinha, inclusive João Cândido.
Outros 600 foram presos e 105 obrigados a embarcar nos porões do navio Satélite, rumo aos seringais do estado do Acre, para trabalhos forçados na produção da borracha.
Catorze deles nunca chegaram ao destino.
Foram fuzilados durante a viagem e tiveram seus corpos jogados ao mar. Passados 113 anos da Revolta da Chibata ainda não se sabe se a punição ao marinheiro Marcelino foi realmente o estopim ou se, o grupo liderado por João Candido iria fazer o levante da revolta nos próximos dias.
Batista das Neves, chamado de ‘marinheiro da selva’, por ter nascido no interior de Mato Grosso, dá nome para enseadas, ruas, praças e avenidas em vários estados brasileiros e foi promovido “post mortem” a Almirante de Esquadra e foi o primeiro comandante do encouraçado Minas Gerais, considerado, na época, um dos mais moderno navios de guerra do mundo.