História de MT
Doninha do Tanque Novo, de Poconé, profetizou a ‘bancarrota’ nas eleições dos irmãos Muller e o fim político
Líder comunitária, espiritual, benzedeira, orientadora com chás homeopáticos, com visões espirituais e curas consideradas milagrosas, ela reunia sincretismo cultural, étnico e religioso quase impossível, na época
Se a tentativa em não criar, por parte do Governo do Estado, uma espécie de ‘mito’ das aparições da guia espiritual “a mulher da verdade” por excelência, elementos simbólicos e história oral não faltaram após a morte de, Laurinda de Lacerda Cintra, a Doninha do Tanque Novo ou Doninha do Caeté, que viveu no distrito e comunidade rural de Poconé(130 Km de Cuiabá), na década de 30, em Mato Grosso.
Líder comunitária, espiritual, benzedeira, orientadora com chás homeopáticos, com visões espirituais e curas consideradas milagrosas, ela reunia sincretismo cultural, étnico e religioso quase impossível, na época.
Doninha vivia um transe, tinha visões da sagrada família (Jesus, Maria, José), dialogou com espíritos e via o futuro e o que viria acontecer, entre eles: Fogo no Pantanal (ocorreu nos últimos meses), e uma peste que mataria milhares em todo mundo e que tornaria as pessoas reféns em suas próprias residências(Covid 19). “Quando os filhos do novo milênio ficarem adultos, vão ver o pantanal pegar fogo e não sairão de casa porque haverá uma grande peste matando pessoas no mundo todo”, disse Doninha para seus seguidores na comunidade de Tanque Novo(25 KM de Poconé) na década de 30.
A história oral foi repassada pelos seus seguidores em um simbolismo e uma sinestesia quase perfeita, a não ser pela acusação de ‘bruxaria’ atribuída a Doninha pelo ‘staff’ do interventor de Mato Grosso, na época, o cuiabano Leônidas de Matos, pelo prefeito de Poconé, Antônio Avelino Corrêa, da Costa(Nhô Tico), e pelo senador mato-grossense, Filinto Muller.
Este último teria praguejado contra ela e lhe atribuído ações de bruxaria, quando ela foi presa e torturada duas vezes: uma em 1932 e outra em 1933.
Na época o Brasil vivia uma efervescência política, na chamada era Vargas, e que teve início logo após a Revolução de 1930, com prisões e torturas em todo o país.
Tanto o interventor de Mato Grosso, quando o prefeito e os irmãos Muller(Filinto, Júlio e Fenelon) apoiavam Getúlio e não aceitaram a posição de Doninha e de dos habitantes de Tanque Novo de apoiarem o partido oposicionista à Vargas.
Sob a égide do Governo Federal de Vargas e da interventoria federal em Mato Grosso, sob Leônidas de Matos, eles mandaram dezenas de policiais da Delegacia Especial de Segurança Política e Social para destruir Tanque Novo e prender Doninha.
Eles justificaram tal atitude – afirmando – que o local(Tanque Novo) era um reduto de pessoas fanáticas e de vândalos.
Encarcerada, Doninha foi vilipendiada em seus direitos como cidadã e foi execrada pelos governantes e políticos que apoiavam Vargas, entre eles, Filinto Strübing Muller que afirmou olhando no rosto de Doninha, no cárcere, “as bruxas deveriam ser queimadas”.
Doninha, por sua vez, disse: “Não sou bruxa Senhor Doutor(referindo-se a Filinto), mas a ‘Mulher da Verdade’ mandou dizer que não sou eu quem vai morrer queimada. Mas Deus já terá me levado deste mundo quando o Senhor for envolvido pelo fogo ainda em vida”.
Doninha faleceu em 23 de Junho de 1973.
Passados 19 dias depois Filinto Müller morreu queimado em um acidente de avião no dia 11 de Julho de 1973 no voo 820 da empresa de viação Varig, no aeroporto de Orly, em Paris, na França.
O avião fazia a rota Rio de Janeiro – Londres e estava em procedimento de pouso numa escala programada. Morreram 123 pessoas e onze sobreviveram.
Entre os mortos estava o senador mato-grossense Filinto Muller, que na época, era líder do governo.
Doninha também teria profetizado ainda na década de 30, tão logo saiu da segunda prisão, em Cuiabá, para onde foi levada por policiais da Delegacia Especial de Segurança Política e Social que, a família Muller iria sofrer constantes derrotas nas eleições e iria ser ‘varrida’ da política mato-grossense e nunca mais iriam ter o poder no estado, entre eles, o próprio Filinto Muller e seus irmãos, Júlio e Fenelon Muller.
Ela teria falado a seus seguidores que Filinto iria perder a eleição para o Governo de Mato Grosso em 1950. No dia 03 de outubro de 1950, em eleição direta, Filinto Muller, do PSD, perdeu a eleição para governador para o médico Fernando Correia da Costa, da UDN. Filinto obteve 38.805 mil votos(47,88%), enquanto Fernado Correia foi eleito governador com 42.313 mil(52,16%), dos votos válidos.
Nessa mesma eleição, seu irmão, Júlio Muller(PTB), perdeu a eleição de Senado para o médico, Sílvio Curvo, da UDN. Júlio Muller obteve 25.751 mil votos(33,49%).
Silvio Curvo, por sua vez, foi eleito senado com 31.669 mil votos(41,18%).
Na eleição de 1960 para governador, Júlio Muller também perdeu a eleição para governador para Fernando Correia da Costa.
Júlio obteve 55.105 mil votos(38,48%). Enquanto Fernando Correia foi eleito com 66.206 mil votos(46,23%).
Seus irmãos também nunca mais foram eleitos para nenhum cargo eletivo no estado.
Historicamente, as previsões de Doninha foram 100% comprovadas, segundo seus seguidores.
Entretanto, sendo sua trajetória foi vivenciada por uma só pessoa, seja ela uma construção mítica a partir de histórias de um povo, e é inegável sua influência sobre Mato Grosso, Poconé e seus arredores.