Estamos encerrando o primeiro mês das gestões municipais resultantes das eleições de 2020 e, assim como a cada quatro anos é preciso renovar os mandatos para sintonizá-los com os reais interesses da comunidade, os novos gestores (eleitos ou reconduzidos) devem compreender que as administrações públicas precisam inovar para superar, em cada município, em cada aldeia, as deficiências experimentadas pelas gestões para superar as desconformidades.
Diariamente temos sido inundados por informações coloquiais, técnicas e políticas a respeito do impacto do CORONAVÍRUS na sociedade. O gigantesco volume dessas informações incute na população um temor generalizado pela possibilidade de contaminação; acentuada ansiedade para retomada das rotinas que são desaconselhadas para que se evite a propagação do vírus e, absurdamente, em alguns setores, reações contrárias às pífias medidas adotadas pelas gestões e empreendedores em geral, visando dizimar a PANDEMIA em nosso país.
O alastramento do vírus, em pequeno espaço de tempo e a gravidade da infecção, em muitas pessoas contaminadas, colapsando a estrutura para tratamento de doenças no mundo inteiro, retoma a velha discussão que, tão ou mais importante que o tratamento da doença, é a profilaxia para evitá-la.
Se esse debate não é priorizado em tempos normais, torna-se praticamente ausente na atualidade, quando o tratamento da doença não é valorizado e incrementado. Por isso, autoridades, imprensa e a população em geral só repercutem os pontos negativos e os raros aspectos positivos relacionados ao enfrentamento da doença. Nesse ponto, o Brasil, que se orgulha de possuir um sistema de saúde pública dos mais organizados no mundo, experimenta atualmente um aprofundamento nas desconformidades da política pública em referência, que já não eram poucas, resultado da malversação administrativa, imprimindo ações políticas retrógradas, danificando, quando deveria aprimorar os padrões existentes para responder às demandas da coletividade.
Para enfrentamento efetivo desse mal que assola a humanidade, é fundamental e preponderante o aprimoramento das discussões e adoção de medidas corretivas para que o Sistema Único de Saúde receba o tratamento adequado dos gestores e tenha a incumbência de gerir, com a eficiência preconizada pela Constituição da República, a crise sanitária que estamos enfrentando e que cresce a cada dia. Não estamos mais nos tempos remotos, quando se cuidava das anomalias na saúde com práticas tradicionais populares. A humanidade cresceu em ritmo vertiginoso e para atendê-la, foram criados novos métodos, concebidos a partir de reiteradas pesquisas e da supremacia da ciência. E na hipótese em cotejo, mesmo esses métodos estão sendo repensados.
A não implementação das medidas indicadas pela ciência e de ações inovadoras para gestão da vida, resultará em maior número de pessoas afetadas, impactando diretamente em manejo de medidas judiciais para obrigar o Estado brasileiro, em seus três níveis, a adotá-las, inaugurando um novo ciclo da chamada Judicialização da Saúde. Afinal, a Justiça, a liberdade, a igualdade e o BEM ESTAR são princípios assegurados na Constituição da República. E é perverso conectar o debate sobre saúde com as questões econômicas, como se fosse possível tratar de regras para distribuição de riqueza, redução da pobreza, livre mercado etc., sem relevar o pressuposto fundamental da vida humana.
Apesar da eficiência demonstrada pela ciência na criação em prazo recorde de vacinas para enfrentar o mal que assola a todos, indistintamente, é importante o aprimoramento, inclusive com a efetiva intervenção do setor público, das práticas sociais saudáveis, culminando com a edificação de barreiras para que o mal não prevaleça. Aliás, tem sido assim ao longo da trajetória humana. A descoberta de medicamentos para o combate às doenças instaladas não prescinde da abordagem ampliada para prevenção, via comportamento humano adequado para isso.
E não há como conseguir esse desiderato sem inovação. Einstein já ensinava que é “insano tentar alcançar novos resultados, adotando as mesmas práticas”. Em inúmeros setores da sociedade, algumas práticas culturais contribuem substancialmente para qualificar a vida, evitando doenças. Esses resultados são obtidos com desembolso de valores por quem detém e, quando conduzidos pelo setor público, integram projetos especiais setorizados e que, por vezes, não são continuados, porquanto vinculados a determinado perfil gerencial do ocupante do poder. É preciso, pois, inseri-los na pauta regular de todas as pastas da administração e, se possível, referendá-los com a efetiva participação do Legislativo, em leis.
A implementação de práticas culturais utilitárias (integrando as áreas de cultura, educação e saúde) para discussão, formatação e desencadeamento intersetorial de ferramentas que garantam a manutenção da sanidade mental da população é preponderante. Obviamente que essas ações devem ser analisadas, sopesando as características dos destinatários, rompendo, todavia, a visão tradicional que se tem das clientelas do serviço público, ou seja, cliente da área de saúde é quem está doente; da educação é quem precisa receber o ensino formal e da assistência social é aquele desguarnecido pela sorte e se encontra em situação de hipossuficiência. Na gestão da vida, todos são clientes dos referenciais que importam ao coletivo. E esse escopo requer do gestor municipal a compreensão para empreender medidas não necessariamente onerosas, mas que impactem na qualidade de vida dos munícipes.
Destarte, o poder público precisa coordenar a utilidade das atividades lúdicas; disseminar as práticas esportivas em todas as idades; remodelar a estrutura administrativa de cada órgão, transformando servidores e agentes públicos em evidências de um formato diferenciado de exercício da força de trabalho e, sobretudo, a utilização das mídias para compartilhar as medidas recomendadas e financiadas com recursos públicos. Inclui-se nesse escopo, por exemplo, as atividades esportivas como caminhadas; corridas; dança; exposições artísticas; associativismo e as mensagens sobre alimentação saudável, higiene, etc.
Além da implantação no âmbito da administração pública, essa gama de atividade precisa ser incentivada também para adoção pelos empreendedores, em face do papel utilitário das medidas. Obviamente que isso é um escopo de médio e longo prazos, mas, de imediato, a criação de laboratórios experimentais com a estrutura administrativa importa em mudança de paradigma, inovando para afastar o mal.
O desafio para inovar nas ações, objetivando superar a PANDEMIA, pode ser viabilizado com menor esforço, em face do atual momento, no qual as administrações municipais foram renovadas ou, na hipótese de continuidade, pela recondução dos dirigentes, em virtude da empatia gerada na gestão finalizada. Nesse contexto, algumas medidas precisam e devem ser coordenadas pelos gestores, liderando implantação de pacto municipal com envolvimento do setor público, privado, donas de casa, estudantes, trabalhadores etc., afinal, só com a soma das pequenas medidas que cada um pode adotar é possível avançar.
Se o Sistema Único de Saúde, construído com a efetiva integração dos três níveis de poder, sofrer, aliás, como tem sofrido, desatenção de um dos seus integrantes, os demais precisam responder pela integralidade, ainda que precariamente, mas com a plena conscientização da comunidade. Para tanto, a partir do estudo da realidade, cada município pode complementar os normativos de regência do Sistema com a edição de regras pertinentes às peculiaridades locais, visando a plenitude da vida.
Edmilson da Costa Pereira é procurador de Justiça em Mato Grosso, titular da Procuradoria Especializada da Cidadania e do Consumidor