Polícia
De corrupto a delator: José Riva escapa de condenações graças a nova lei de improbidade e acordo com o MP
Com a nova regra e a retroatividade reconhecida pelo STF (Tema 1199), centenas de ações foram atingidas, inclusive as de Riva

Conhecido nacionalmente como um dos maiores corruptos da história recente do país, o ex-deputado estadual José Riva – que já acumulou mais de 120 processos por corrupção, lavagem de dinheiro, peculato e improbidade administrativa – vem conseguindo escapar de condenações graças à combinação de dois fatores decisivos: a colaboração premiada firmada com o Ministério Público e a mudança na Lei de Improbidade Administrativa, promovida pela Lei nº 14.230/2021.
Durante seus mandatos na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT), Riva foi apontado como o principal articulador de um esquema bilionário de desvio de recursos públicos por meio de contratos falsos com gráficas, empresas de fachada e pagamentos simulados com cheques públicos.
Veja às brechas na Justiça de MT
1995 a 2015: Riva comandou a ALMT por quatro mandatos e operou esquemas como o da Sabia Distribuidora, empresa de fachada sediada em Várzea Grande, que recebeu mais de R$ 1 milhão sem entregar qualquer serviço.
2015: renuncia ao mandato e inicia uma série de condenações por improbidade.
2016 a 2020: acumula mais de 100 ações cíveis e penais, com diversas condenações à devolução de recursos e perda de direitos políticos.
2021: entra em vigor a nova Lei de Improbidade Administrativa (Lei 14.230/21), que exige dolo específico para condenações.
2022 a 2025: a maior parte das ações contra Riva é reformada, extinta ou considerada improcedente por ausência de prova direta de intenção dolosa – ainda que os esquemas estejam documentados.
O jogo muda para Riva
A Lei nº 14.230/2021 alterou profundamente a legislação sobre improbidade. Agora, só há condenação se o Ministério Público comprovar que o agente agiu com intenção específica de lesar o erário – o chamado dolo específico.
A medida foi considerada “um presente à impunidade” por muitos promotores de Justiça, já que antes bastava a demonstração de irregularidade ou culpa grave para responsabilizar agentes públicos. Com a nova regra e a retroatividade reconhecida pelo STF (Tema 1199), centenas de ações foram atingidas, inclusive as de Riva.
Sentença Recente
Em sentença recente sobre a Sabia Distribuidora Ltda., a juíza Célia Regina Vidotti reconheceu o desvio de verbas por meio de cheques assinados por Riva e o então deputado Humberto Bosaipo. No entanto, somente Bosaipo foi condenado – a Riva foi concedido o benefício da colaboração premiada.
“A empresa jamais prestou qualquer serviço à Assembleia Legislativa, sendo utilizada unicamente como instrumento para viabilizar pagamentos indevidos”, diz trecho da decisão.
“As alegações do Ministério Público se baseiam unicamente em indícios e presunções, não havendo certeza da prática dos atos de improbidade administrativa apontados nesta ação”, pontuou a magistrada em outro processo já arquivado.
Integrantes do Ministério Público, sob reserva, afirmam que a combinação entre nova legislação e acordos de delação “acabou blindando o principal cérebro do esquema”, e que José Riva “entregou todo o sistema de corrupção da ALMT, mas também se blindou juridicamente para escapar da maior parte das penas”.
Riva e os efeitos da nova lei
Ano |
Fato Relevante |
Resultado |
2000–2014 |
Assinatura de cheques para empresas fantasmas |
Reconhecimento de desvio |
2015 |
Renúncia e início das condenações |
Condenado em diversas ações |
2021 |
Entrada em vigor da nova lei |
Diversos processos extintos ou reformados |
2022–2025 |
Julgamentos com base na nova legislação |
Riva deixa de ser punido na maioria dos casos |
Colaborador Blindado
José Riva pode não ter deixado a política com honra, mas deixa a Justiça com menos sanções do que o esperado para quem desviou centenas de milhões de reais dos cofres públicos. A nova lei, pensada para coibir abusos, acabou beneficiando justamente os que construíram fortunas em cima da corrupção institucionalizada.