Polícia

Assassino do “danone”: Ex-policial que matou músico será julgado após 14 anos — e é assessor na ALMT

Thiago Festa foi dopado até a morte em clínica clandestina de reabilitação

DA REPORTAGEM 09/06/2025
Assassino do “danone”: Ex-policial que matou músico será julgado após 14 anos — e é assessor na ALMT
Thiago foi abordado por Kleber durante uma blitz armada enquanto estava com um amigo | Arquivo Página 12

Um caso abafado por mais de uma década ressurge com força e indignação em Mato Grosso: o ex-policial civil Kleber Ferraz Albuês, acusado de sequestrar, envenenar e ocultar o corpo do músico Thiago Festa Figueiredo, de 27 anos, será finalmente julgado no próximo dia 27 de junho, após 14 anos de impunidade.

Kleber, que atualmente ocupa um cargo comissionado na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT), como assessor parlamentar do deputado estadual Júlio Campos (UNIÃO), responderá por sequestro qualificado, homicídio doloso, ocultação de cadáver, falsidade ideológica e uso do cargo público para encobrir o crime.

O julgamento será presencial, às 9h, na 1ª Vara Criminal de Cuiabá, e também terá como réu o técnico de informática Hueder Marcos de Almeida, apontado como cúmplice em todas as etapas do assassinato.

Thiago foi abordado por Kleber durante uma blitz armada enquanto estava com um amigo. Contra a vontade e sem qualquer ordem judicial, foi levado à força para uma clínica de reabilitação pertencente à mãe do policial — que funcionava de forma irregular.

Segundo o Ministério Público, dentro da clínica, Thiago foi drogado com um coquetel de medicamentos sedativos, apelidado pelos próprios internos de danone”. Mesmo tendo alertado que era alérgico, foi trancado no quarto da disciplina”, onde morreu sem socorro.

O corpo foi abandonado às margens de uma rodovia em Cuiabá. Para encobrir o crime, Kleber — então ainda policial civil — forjou registros oficiais, simulando um simples “encontro de cadáver”.

De réu por homicídio a servidor da ALMT

Apesar da gravidade dos crimes e da demissão da Polícia Civil em 2014, Kleber foi contratado em fevereiro de 2025 como assessor no gabinete de Júlio Campos, que também já foi governador, senador e conselheiro do TCE-MT. A nomeação causou revolta nas redes sociais.

“Meu irmão foi morto como um animal. Dopado, torturado e jogado numa estrada. E o assassino hoje ocupa um cargo de confiança, em um gabinete que trata de segurança pública. Isso é um escárnio”, disse Thais Figueiredo, irmã da vítima, que irá depor no júri de forma remota por razões de segurança.

Em nota, o gabinete do deputado afirmou que “confia na Justiça” e que Kleber apresentou todas as certidões negativas exigidas no momento da contratação. O parlamentar ainda destacou que aguardará a decisão final do processo para adotar providências administrativas.

Após a denúncia ser aceita pela Justiça em 2012, Kleber foi afastado da função de investigador e demitido da Polícia Civil por processo administrativo. Em 2014, foi reintegrado temporariamente, mas teve a demissão restabelecida em 2015 após denúncia à Ouvidoria do Estado.

O Ministério Público Estadual chegou a denunciar Kleber por sete crimes, incluindo falsidade ideológica, prevaricação e fraude processual, além do homicídio de Thiago.

Apesar disso, nunca foi preso. Nunca enfrentou o júri. Até agora.

O caso levanta questionamentos sobre o sistema de controle e fiscalização do serviço público em Mato Grosso, bem como sobre a lentidão na responsabilização criminal de agentes do Estado envolvidos em crimes graves. A família de Thiago, que esperou mais de uma década por justiça, espera que a impunidade finalmente seja rompida.