Política
EUA sancionam mulher de Alexandre de Moraes com a Lei Magnitsky
Também foi incluído na lista o Lex - Instituto de Estudos Jurídicos, empresa mantida por Viviane e os três filhos do casal: Gabriela, Alexandre e Giuliana Barci de Moraes, com sede em São Paulo

O governo de Donald Trump anunciou nesta segunda-feira (22/9) sanções contra a mulher do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.
Viviane Barci de Moraes foi sancionada, assim como o ministro, com a Lei Magnitsky, uma das mais severas disponíveis para Washington punir estrangeiros que considera autores de graves violações de direitos humanos e práticas de corrupção, conforme publicado no site do Tesouro americano.
Também foi incluído na lista o Lex - Instituto de Estudos Jurídicos, empresa mantida por Viviane e os três filhos do casal: Gabriela, Alexandre e Giuliana Barci de Moraes, com sede em São Paulo.
Segundo reportagem do jornal O Globo, o Instituto é dono de onze imóveis da família, cujos valores declarados somam R$ 12,4 milhões.
Advogada, Viviane também é sócia do escritório Barci de Moraes Sociedade de Advogados.
Por meio de nota, Alexandre de Moraes classificou a medida como "ilegal" e lamentável" e afirmou que continuará "a cumprir minha missão constitucional de julgar com independência e imparcialidade".
Já o secretário do Tesouro, Scott Bessent, afirmou em uma nota publicada no site do Tesouro que "Alexandre de Moraes é responsável por uma campanha opressiva de censura, detenções arbitrárias e processos politizados — inclusive contra o ex-presidente Jair Bolsonaro".
"A ação de hoje deixa claro que o Tesouro continuará a perseguir indivíduos que fornecem apoio material a Moraes enquanto ele viola os direitos humanos."
Nos últimos dias, interlocutores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tratavam a possibilidade de aplicação de novas sanções pelos EUA durante a passagem de Lula pelo país como remota.
O cálculo era de que os EUA sabiam que se fizessem isso, dariam ainda mais munição para o discurso de Lula nesta terça-feira (23/9), na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). Mas apesar de considerar a hipótese remota, o governo não a descartava totalmente.
Em nota, o Itamaraty afirmou ter recebido a notícia "com profunda indignação" e que o recurso utilizado por Trump é uma "ofensa aos 201 anos de amizade entre os dois países".
"Esse novo ataque à soberania brasileira não logrará seu objetivo de beneficiar aqueles que lideraram a tentativa frustrada de golpe de Estado, alguns dos quais já foram condenados pelo Supremo Tribunal Federal. O Brasil não se curvará a mais essa agressão", diz a nota.
Já o STF lamentou e considerou "injusta" as sanções aplicadas a Viviane de Moraes.
"Se já havia injustiça na sanção a um juiz pela sua atuação independente e dentro das leis e da Constituição, ainda mais injusta é ampliação das medidas para um familiar do magistrado."
As sanções anunciadas agora já haviam sido mencionadas pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) como medidas que haviam sido pedidas e estavam sendo estudadas pelo governo norte-americano.
Nos últimos dias, pessoas com interlocução junto ao presidente Lula afirmavam que novas rodadas de sanção possivelmente envolveriam medidas individuais e não sistêmicas como foi o tarifaço, anunciado por Trump no início de julho.
O entendimento é de que, dois meses após a aplicação das tarifas em âmbito global, a economia norte-americana já estaria sentindo os efeitos negativos da medida como inflação e menor redução na geração de empregos.
Em entrevista à BBC News Brasil em agosto, Eduardo Bolsonaro afirmou que estava disposto a ir "até as últimas consequências" para tirar Moraes, que ele classifica como "psicopata", do poder.
O deputado, que está vivendo nos Estados Unidos desde o início do ano, afirmou que "pleiteia sanções individuais para pessoas específicas", e mencionou a mulher de Moraes, "que é o braço financeiro dele".

Crédito,Adriano Machado/Reuters
Moraes foi incluído na lista no fim de julho, enquanto o processo judicial por golpe de Estado contra Bolsonaro avançava no Supremo. O ex-presidente foi condenado a 27 anos e três meses de prisão no último dia 11.
Foi a primeira vez que uma autoridade brasileira foi submetida a tal punição. Na lista, estão autoridades de países como China, Rússia, Bulgária, Camboja, Cuba, Libéria, Paraguai, dentre outros.
Pouco tempo depois, o ministro Flávio Dino proferiu uma decisão proibindo a aplicação no Brasil de sentenças judiciais e leis estrangeiras que não estejam validadas por acordos internacionais ou referendadas pela Justiça brasileira, incluindo a Lei Magnitsky.
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Aprovada durante o governo de Barack Obama, em 2012, a Lei Magnitsky foi criada para punir autoridades russas envolvidas na morte do advogado Sergei Magnitsky, que denunciou um esquema de corrupção estatal e morreu sob custódia em Moscou.
Inicialmente voltada para os responsáveis por sua morte, a lei teve seu alcance ampliado em 2016, após uma emenda que permitiu a inclusão de qualquer pessoa acusada de corrupção ou de violações de direitos humanos na lista de sanções.
Desde então, a lei passou a ter aplicação global.
Em 2017, pela primeira vez a lei foi aplicada fora do contexto russo, durante o primeiro governo de Donald Trump.
Na ocasião, três latino-americanos foram alvo de sanções por corrupção e violações de direitos humanos: Roberto José Rivas Reyes, então presidente do Conselho Supremo Eleitoral da Nicarágua; Julio Antonio Juárez Ramírez, deputado da Guatemala; e Ángel Rondón Rijo, empresário da República Dominicana.

Crédito,Getty Images
As punições incluem o bloqueio de bens e contas no país, além da proibição de entrada em território americano. Não há necessidade de processo judicial — as medidas podem ser adotadas por ato administrativo, com base em relatórios de organizações internacionais, imprensa ou testemunhos.
Segundo o texto da própria lei, são consideradas violações graves atos como execuções extrajudiciais, tortura, desaparecimentos forçados e prisões arbitrárias sistemáticas.
Também podem ser sancionados agentes públicos que impeçam o trabalho de jornalistas, defensores de direitos humanos ou pessoas que denunciem casos de corrupção.
A Lei Magnitsky já foi usada contra membros do judiciário de países como Rússia e autoridades de Turquia e Hong Kong, em casos de perseguição a opositores, julgamentos fraudulentos ou repressão institucionalizada.
Em Entrevista à BBC News Brasil, William Browder, executivo financeiro britânico que liderou a campanha pela aprovação da lei nos Estados Unidos, afirmou que o uso da lei para punir Moraes é "deturpação".
"O uso atual da Lei Magnitsky pelos Estados Unidos contra um juiz envolvido em um processo contra um ex-político, no qual os Estados Unidos disseram claramente que estão irritados porque esse ex-político está sendo processado, não é um uso apropriado da Lei Magnitsky, e é uma deturpação de suas intenções originais", afirmou ele.