Brasil

Os Yanomami contra o coronavírus (e contra a diarreia, as lombrigas e os garimpeiros...)

Missão médica das Forças Armadas vai às aldeias em Roraima cercada de controvérsia e sob pressão para prestar atendimento sem desrespeitar cultura da etnia

12/07/2020
Os Yanomami contra o coronavírus (e contra a diarreia, as lombrigas e os garimpeiros...)
Foto: JOÉDSON ALVES / EFE
Os Yanomami do Brasil só dão nome a um filho depois que este é capaz de se virar por conta própria. Até então, é conhecido como filho de… E só quando o filho é autônomo é que pensam em ter outro. O segredo desses indígenas de Amazônia para espaçar a prole são plantas anticoncepcionais obtidas na maior floresta tropical do mundo. Eles fazem isso há séculos. O contato com os brancos quebrou o equilíbrio de muitos outros aspectos de suas vidas e, além disso, trouxe doenças desconhecidas cujo caso mais recente é a covid-19, causada pelo novo coronavírus.

A praga, que se espalha rapidamente pelo interior do Brasil, ameaça os cantos mais remotos da Amazônia, que, vista de cima, é um denso tapete verde cortado por imensos rios de água marrom avermelhada. Centeno Batista, de 32 anos, está com sua mãe e outros parentes na fila para fazer um teste de Covid-19 em sua aldeia, Waikás, localizada em território Yanomami. Batista espera sentado debaixo de um toldo enquanto enfermeiros militares, trazidos em um helicóptero Black Hawk, coletam uma gota de sangue para o teste. O resultado sai em alguns minutos. Negativo.

Segundo essa análise, de confiabilidade limitada, Waikás está livre do contágio. Um alívio para Batista, cuja vida também foi transtornada pelo vírus que revolucionou o planeta. Por enquanto, ele não pensa em voltar a Boa Vista, capital de Roraima. Fica a uma hora e meia de voo ou duas semanas de navegação. “Tenho muito medo de ir à cidade, porque lá posso me contagiar e poderia morrer”, explica esse indígena no espanhol que aprendeu quando criança do outro lado da fronteira, na Venezuela. Foi na cidade que ele soube há dois meses, ao ver as notícias, que uma nova doença dos brancos estava matando milhares de pessoas no Brasil e até na China.

Fazer testes rápidos de coronavírus na população de três aldeias Yanomami —são 300 no total— é parte de uma operação lançada na semana passada pelas Forças Armadas brasileiras com vários objetivos: comprovar se a epidemia chegou até lá, reforçar o atendimento médico com a transferência de profissionais de saúde para fazer consultas durante algumas horas, entregar alimentos e melhorar a imagem dos militares tanto dentro quanto fora do Brasil. Saber qual é a prioridade depende de se a pergunta é feita aos defensores dos indígenas ou ao Governo, que mobilizou 34.000 soldados contra a epidemia e outros 3.000 contra o desmatamento.