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Justiça da Venezuela determina prisão de Edmundo González, candidato da oposição; entenda acusações
A ordem foi assinada pelo juiz Edward Briceño, poucas horas depois de o Ministério Público da Venezuela pedir a prisão
Um juiz da Venezuela ordenou nesta segunda-feira (02) a prisão de Edmundo González Urrutia, candidato da oposição à presidência.
A ordem foi assinada pelo juiz Edward Briceño, poucas horas depois de o Ministério Público da Venezuela pedir a prisão.
Em documento assinado pelo promotor Luis Ernesto Dueñez Reyes, González Urrutia foi acusado de suposta usurpação de funções, falsificação de documentos públicos, instigação à desobediência às leis, conspiração, sabotagem de sistemas e associação criminosa.
O pedido de prisão foi enviado a um juizado especializado em casos de terrorismo.
Esta é a primeira vez que é emitido um mandado de prisão contra González Urrutia, diplomata aposentado.
Antes, ele havia sido convocado pelo Supremo Tribunal da Venezuela (TSJ) para testemunhar, depois que o governo de Nicolás Maduro pediu ao órgão que revisasse os resultados das eleições.
Nome mais popular da oposição, María Corina Machado afirmou em suas contas nas redes sociais que o poder venezuelano, que seria alinhado ao presidente Maduro e ao chavismo, "perdeu toda a noção da realidade".
“Ao ameaçar o presidente eleito, apenas conseguem nos unir mais e aumentar o apoio dos venezuelanos e do mundo a Edmundo González”, escreveu a opositora sobre o pedido de prisão de González Urrutia.
O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) declarou o presidente Nicolás Maduro vencedor do pleito de 28 de julho, mas nunca publicou as atas detalhadas que comprovariam o resultado.
A oposição denuncia que os resultados anunciados pelo CNE foram adulterados e que o vencedor teria sido González Urrutia.
A Plataforma Democrática Unitária (PDU), da qual faz parte González Urrutia e que é liderada por María Corina Machado, divulgou comprovantes de mais de 80% das mesas de votação em um site com acesso livre.
O governo Maduro alega que esses comprovantes são falsos.
A vitória da oposição representaria o fim do regime chavista que governa a Venezuela desde 1999. Maduro está no cargo há 11 anos. Antes dele, Hugo Chávez (1954-2013) ocupou a presidência do país de 1999 a 2013.
Desde os resultados anunciados pelo CNE, tem havido protestos em todo o país a favor e contra a versão oficial.
Centenas de manifestantes opositores foram presos, incluindo menores de idade.
Em 22 de agosto, os juízes do TSJ, considerados simpáticos ao governo chavista, endossaram a decisão do CNE.
Na ocasião, a câmara eleitoral do TSJ afirmou que González Urrutia "não compareceu a nenhuma das fases" de um processo de averiguação sobre as eleições, o que poderia acarretar em "sanções previstas no ordenamento jurídico vigente".
Ao ser convocado, González anunciou que não compareceria ao TSJ por considerar que a câmara eleitoral estava usurpando as funções do CNE e porque, ao fazê-lo, colocaria-se em uma situação de "absoluto desamparo".
A missão criada pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas para acompanhar a situação política da Venezuela tem questionado a idoneidade tanto do TSJ como do CNE.
Desde o início da crise eleitoral, o Brasil tem apostado no papel de mediador, propondo negociações entre o governo venezuelano e a oposição.
O Itamaraty "acompanha com preocupação" o pedido de prisão de González, segundo uma fonte próxima ao tema ouvida pela BBC News Brasil.
A avaliação é de que o Brasil já fez o que poderia na crise. A comunicação com Caracas segue ocorrendo, mas não de forma tão fluida como antes, acrescentou outra fonte diplomática.
A BBC News Brasil questionou o Itamaraty a respeito, mas a pasta ainda não se posicionou oficialmente sobre o pedido de prisão de González.
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Em março, foi negado o registro da candidatura de María Corina Machado por conta de várias acusações na Justiça, considerada por atores externos como aparelhada pelo regime de Maduro.
Machado é alvo de diferentes acusações, como corrupção e formação de quadrilha.
Impossibilitada de concorrer, Machado escolheu a acadêmica Corina Yoris, de 80 anos, como substituta.
No entanto, Yoris também não pôde registrar sua candidatura devido a problemas no sistema de registro de candidaturas do CNE, empecilho que a oposição atribuiu ao governo.
González tornou-se então o surpreendente "candidato provisório" da oposição.
O diplomata aposentado, então com 74 anos, tinha perfil discreto. Ele nunca havia ocupado cargos públicos e nem mesmo era amplamente conhecido nos círculos da oposição.
Durante as três semanas seguintes, ele foi referido como um "substituto", e esperava-se que de fato ele seria substituído por um candidato mais conhecido.
Até que, um dia antes do prazo para mudar os nomes na cédula presidencial, a Plataforma Unitária Democrática (PUD) anunciou que manteria o ex-diplomata como candidato.
Mas, em vez de colocá-lo em destaque, a coalizão de oposição manteve González em segundo plano, enquanto Machado cruzava o país pedindo às pessoas que votassem nele.
Embora possa parecer uma estratégia incomum na maioria dos países, na Venezuela, onde ativistas da oposição são perseguidos e, em alguns casos, presos, foi considerada uma precaução sábia por muitos.