Política

Entidades aumentam pressão pelo veto ao PL do abuso de autoridade

18/08/2019
“O que tenho ouvido falar, tem muita coisa, até botei algumas perguntas no Facebook ontem (quinta-feira — 15/8). ‘Veta, veta, veta’. Você já leu o projeto? Ninguém leu. Tem coisa boa, tem coisa ruim, não sei”, afirmou. “Eu não quero é, no primeiro momento, o policial militar, se é que isso está e não sei se está lá (no texto), o cara vir algemar alguém de forma irregular e ter uma cadeia para isso. Isso não pode existir. O resto a gente vai ver, analisar. Vetando, sancionando ou vetando parcialmente, eu vou até levar pancada. Vou apanhar de qualquer maneira. Muitas vezes ‘sim’ ou ‘não’, ou abstenção, você apanha.”   Fato é que o projeto tem encontrado forte resistência, principalmente entre instituições e entidades. O Ministério Público, por exemplo, vê o PL com indignação e pede a Bolsonaro que o vete. A avaliação no órgão é que os parlamentares aproveitaram uma crise envolvendo a Operação Lava-Jato no Paraná para aprovar o texto. Promotores de Justiça do Estado de São Paulo — que integram 15 núcleos do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do MP estadual — divulgaram nota dizendo que a intenção do projeto é “impedir, acuar, dificultar e inviabilizar o exercício responsável, eficiente e eficaz da atividade investigativa, repressiva e punitiva do MP e de outros órgãos e instituições reconhecidas e admiradas pela sociedade”.   Já o presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Judiciária (ADPJ), Rafael Sampaio, anunciou que a entidade está preparando uma nota técnica, a ser enviada a Bolsonaro, também com pedido para que a matéria seja vetada, porque “inviabiliza a atividade policial”. Além de criticar o ponto que trata do uso de algemas, ele condenou o item que prevê a condução coercitiva apenas nos casos em que o investigado descumpre uma intimação para prestar depoimento.   A Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) afirmou, por sua vez, que a medida tem “clara finalidade de intimidar agentes públicos responsáveis pelas investigações”. De acordo com a entidade, o texto não contou com debate amplo na sociedade e foi articulado em uma legislatura anterior no Senado. “A Fenapef observa que o projeto foi proposto por um grupo de (ex) senadores que não são mais parlamentares da Casa; com pouca ou nenhuma discussão pela sociedade civil e aprovado na calada da noite pela Câmara”, diz um trecho da nota.   A Fenapef destacou ainda que o combate ao crime será prejudicado caso o projeto entre em vigor. “No entendimento da federação, o amplo subjetivismo da lei e a imputação de novos crimes aos policiais, juízes e promotores têm o objetivo de impedir a atuação desses agentes públicos e frear as investigações contra a corrupção e o crime organizado”, emendou a entidade, frisando que enviará a Bolsonaro um pedido de veto à matéria.  

Constituição

O advogado Miguel Gualano de Godoy, professor de direito constitucional da Universidade Federal do Paraná (UFPR), disse que o projeto foi aprovado na esteira de diversas decisões judiciais de legalidade controversa. No entanto, ele observou que já há instrumentos para coibir certos tipos de abusos. “O projeto busca tratar como ilícito condutas que estão na seara típica de atuação do MP e dos juízes, cuja independência funcional é garantida pela Constituição”, ressaltou. “Medidas e decisões que se reputem erradas comportam recursos. E aquelas que são tomadas em manifesto desacordo com a lei e de forma dolosa, já possibilitam responsabilização dos agentes públicos.”   Já o advogado criminalista Willer Tomaz afirmou que a tipificação criminal do abuso de autoridade é uma conquista, e não uma tentativa de asfixia das grandes investigações em curso no país. “O que se busca é a proteção do indivíduo e o respeito às leis. Essa votação está pendente desde 2017 e apenas coincidiu com o cenário atual, de escândalos envolvendo autoridades dos Três Poderes”, defendeu.  

Ataque de hackers

A aprovação relâmpago da matéria ocorreu na sequência do ataque hacker à Lava-Jato e da publicação de supostos diálogos entregues pelos cibercriminosos ao site The Intercept. As conversas indicariam parcialidade na atuação do então juiz Sérgio Moro e de procuradores da Lava-Jato, como o coordenador da força-tarefa em Curitiba, Deltan Dallagnol.