Política

Alexandre de Moraes determina prisão domiciliar de Bolsonaro

Bolsonaro também está proibido de receber visitas, "salvo de seus advogados regularmente e com procuração nos autos, além de outras pessoas previamente autorizadas" pelo STF

PEDRO RIBEIRO/DA EDITORIA/COM BBC 04/08/2025
Alexandre de Moraes determina prisão domiciliar de Bolsonaro
Ex-presidente não poderá receber visitas nem usar o celular, "diretamente ou por intermédio de terceiros" | Jorge Silva/Reuters

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes determinou, por tempo indeterminado, a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nesta segunda-feira (4/8).

Bolsonaro também está proibido de receber visitas, "salvo de seus advogados regularmente e com procuração nos autos, além de outras pessoas previamente autorizadas" pelo STF.

Os visitantes autorizados não poderão usar celular, fazer fotos ou gravar vídeos, assim como o ex-presidente, que também está proibido de usar o celular "diretamente ou por intermédio de terceiros".

O mandado de busca e apreensão de aparelhos celulares do ex-presidente foi cumprido no fim da tarde em Brasília, segundo informou a Polícia Federal.

O advogado do ex-presidente, Celso Vilardi, foi procurado pela BBC News Brasil, mas não respondeu à mensagem.

Na decisão, Moraes afirma que o ex-presidente descumpriu as medidas cautelares impostas no dia 17/7, quando ele determinou o uso de tornozeleira eletrônica ao ex-presidente, além da proibição do uso de redes sociais diretamente ou por intermédio de terceiros.

Isso porque, segundo o despacho desta segunda, Bolsonaro "produziu material para publicação nas redes sociais de seus três filhos e de todos os seus seguidores e apoiadores políticos, com claro conteúdo de incentivo e instigação a ataques ao Supremo Tribunal Federal e apoio, ostensivo, à intervenção estrangeira no Poder Judiciário brasileiro."

O ministro se referiu às manifestações ocorridas neste domingo (3/8) em diversas cidades do país. Neste dia, Bolsonaro apareceu por meio de uma ligação de vídeo no celular do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), em São Paulo, e depois em um vídeo na rede social de um dos filhos, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).

"A participação dissimulada de Jair Messias Bolsonaro, preparando material pré-fabricado para divulgação nas manifestações e redes sociais, demonstrou claramente que manteve a conduta ilícita de tentar coagir o Supremo Tribunal Federal e obstruir a Justiça, em flagrante desrespeito as medidas cautelares anteriormente impostas", escreve o ministro.

Para Moraes, "as condutas de Jair Messias Bolsonaro, desrespeitando, deliberadamente, às decisões proferidas por esta Suprema Corte, demonstram a necessidade e adequação de medidas mais gravosas de modo a evitar a contínua reiteração delitiva do réu, mesmo com a imposição de medidas cautelares diversas da prisão."

A entrada do condomínio Solar de Brasília, onde Bolsonaro vive, com carros entrando.

Crédito,Leandro Prazeres/BBC

Legenda da foto,A PF realizou busca e apreensão de celulares na casa de Bolsonaro em Brasília nesta segunda

A prisão domiciliar foi decretada nos autos do inquérito que apura a conduta do deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) pelos crimes de coação no curso do processo, obstrução de investigação da chamada trama golpista e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.

O inquérito foi aberto em maio, a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), que apontou que Eduardo Bolsonaro, que atualmente vive nos Estados Unidos, tem feito declarações públicas e postagens em redes sociais afirmando que atua para que o governo norte-americano imponha sanções a ministros do STF e a integrantes da PGR e da Polícia Federal.

Segundo a representação criminal, as manifestações têm tom intimidatório e vêm se intensificando à medida que avança a tramitação da ação penal em que o ex-presidente é acusado de liderar uma organização criminosa para tentar dar um golpe após as eleições de 2022.

Nessa esteira, o presidente americano, Donald Trump, anunciou tarifas retaliatórias de 50% sobre produtos brasileiros, que começarão a valer a partir desta quarta-feira (6/8).

E na semana passada, o governo americano aplicou contra Moraes a Lei Global Magnitsky — uma das mais severas disponíveis para Washington punir estrangeiros que considera autores de graves violações de direitos humanos e práticas de corrupção.

Praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, com apoiadores de Bolsonaro no último domingo.

Crédito,Pilar Olivares/Reuters

Legenda da foto,Em Copacabana, manifestação foi organizada por Flávio Bolsonaro, que ligou para o pai e o colocou no viva-voz

'Flagrante óbvio'

As manifestações ocorridas no domingo em diversas cidades do país contaram com a presença "virtual" de Bolsonaro, por meio do celular do deputado Nikolas Ferreira, em São Paulo.

Nas redes sociais, Ferreira chamou a decisão de "ditadura confusa" e disse que Moraes deveria ir para a "cadeia".

No Rio de Janeiro, o senador Flávio Bolsonaro, que era também um dos organizadores do ato, ligou para o ex-presidente, colocando a chamada brevemente no viva-voz.

Em seguida, Flávio publicou um vídeo mostrando o pai durante a ligação, em casa, mandando uma mensagem a seus apoiadores.

A publicação foi apagada posteriormente, o que, segundo Moraes, foi com "um claro intuito de omitir o descumprimento das medidas cautelares praticado por seu pai".

"O flagrante desrespeito às medidas cautelares foi tão óbvio que, repita-se, o próprio filho do réu, o senador Flávio Nantes Bolsonaro, decidiu remover a postagem realizada em seu perfil, na rede social Instagram, com a finalidade de omitir a transgressão legal", escreveu Moraes.

Efetivamente, não há dúvidas de que houve descumprimento da medida cautelar imposta, uma vez que, as redes sociais do investigado Eduardo Nantes Bolsonaro foram utilizadas a favor de Jair Messias Bolsonaro".

Reações

"Não é coincidência que aqueles que mais enfrentam o sistema sejam os mais perseguidos por ele. O poder que deveria proteger o cidadão de bem, hoje serve a interesses políticos. A prisão domiciliar imposta a Bolsonaro não é justiça, é perseguição!", diz a nota do PL, publicada em redes sociais.

O líder do partido na Câmara, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), escreveu em sua rede social que a prisão de Jair Bolsonaro demonstra que a democracia no Brasil teria acabado.

"Não há mais instituições, há tiranos com toga", disse Cavalcante, defendendo que o ex-presidente não teria cometido crime e nem teria tido direito à defesa.

Eduardo Bolsonaro afirmou que a prisão ocorreu "sem crime, sem evidências, sem julgamento".

Ele publicou nas suas redes sociais uma nota em português e outra em inglês, dizendo que "o Brasil não é mais uma democracia. O mundo precisa notar isso".

Assim como o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), Eduardo Bolsonaro afirmou que a decisão de Moraes ocorreu no mesmo dia em que a organização Civilization Works publicou dossiê acusando Moraes de criar uma "estrutura paralela de inteligência" para investigar perfis nas redes sociais dos envolvidos no ato golpista de 8 de janeiro para justificar as prisões.

O senador Flávio Bolsonaro, disse em entrevista à CNN Brasil que a prisão do pai demonstra que o Brasil estaria agora "oficialmente numa ditadura".

"Uma única pessoa sozinha decreta a prisão de um ex-presidente da República, uma pessoa honesta, uma pessoa correta", disse Flávio, afirmando que o processo contra o pai seria um "jogo de cartas marcadas".

"Era tudo o que o Alexandre Moraes queria, se vingar do presidente Bolsonaro."

O senador acusou Moraes de previamente "desequilibrar o processo eleitoral" quando foi presidente do TSE, durante as eleições de 2022 — "pesando mais a favor do nosso concorrente", nas palavras de Flávio.

A ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL-RJ) escreveu uma mensagem curta, sem mencionar nomes. "E os céus anunciarão a sua justiça; pois Deus mesmo é o juiz", escreveu ela no Instagram.

Tornozeleira eletrônica sendo exibida por Jair Bolsonaro.

Crédito,Getty Images

Legenda da foto,Moraes determinou o uso de tornozeleira eletrônica e medidas restritivas no dia 17/7

Já o líder do PT na Câmara dos Deputados, o parlamentar Lindbergh Farias (RJ) afirmou que a prisão determinada pelo STF foi "proporcional à gravidade dos atos".

"A medida não se deu apenas por descumprir as cautelares já impostas, mas por reincidir de forma deliberada, debochar da autoridade judicial e seguir atuando contra o Estado Democrático de Direito", defendeu o petista na rede social X.

"Ele [Jair Bolsonaro] apareceu em chamada de vídeo durante ato público, com divulgação em redes sociais administradas por seus filhos, violando a proibição de uso direto ou indireto de redes. Além disso, segue promovendo sanções estrangeiras contra o Brasil e atentando contra a soberania nacional em articulação com atores políticos internacionais", enumerou Farias.

Membro do governo Lula, Marcelo Freixo (PT-RJ) defendeu em suas redes sociais que Bolsonaro foi penalizado com a prisão domiciliar porque "descumpriu mais uma vez uma decisão judicial".

"Bolsonaro tentou transformar tornozeleira e proibição de redes em espetáculo público. Houve descumprimento reiterado de decisão judicial. Desacato de decisão judicial não é discurso político, é crime. Ele pediu pra ser preso", argumentou Freixo, presidente da Embratur.

O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), classificou a prisão de Jair Bolsonaro como um "capítulo sombrio na história de perseguição política do STF".

Segundo escreveu Zema em sua conta no X (ex-Twitter), Bolsonaro teria sido punido apenas por ter tido "sua voz ouvida nas redes". O governador prestou solidariedade ao ex-presidente e sua família.