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Fundada por padre Robson, Afipe negociou imóveis com 4 empresas que operam na mesma sala em prédio de luxo de Goiânia, diz MP

Processo relata que todas são vinculadas às mesmas pessoas e com ao menos três delas entidade fez transações milionárias. Apenas uma delas não tem o mesmo contador. MP vê indícios de crimes na relação, o que o padre nega

28/08/2020
Fundada por padre Robson, Afipe negociou imóveis com 4 empresas que operam na mesma sala em prédio de luxo de Goiânia, diz MP
Fotos: MP-GO/Divulgação/Afipe/Divulgação
O Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) constatou que quatro empresas que faziam negócios milionários com a Associação Filhos do Pai Eterno (Afipe) eram ligadas às mesmas pessoas e funcionavam no mesmo endereço, na sala de um prédio de luxo, em Goiânia. Além disso, o contador de três delas é o mesmo.

De acordo com o MP, tais negociações reforçam indícios de crimes uma vez que "as transações feitas por esse grupo de pessoas e empresas são sempre prejudiciais financeiramente para as Afipes, isto em concordância do padre Robson e dos demais diretores das associações".

As conclusões foram feitas no âmbito da Operação Vendilhões, deflagrada para apurar desvios de doações de fiéis na entidade e que cumpriu 16 mandados de busca e apreensão. Fundador e presidente afastado da Afipe, padre Robson sempre negou as acusações. A defesa dele disse que as transações foram "legais e legítimas".

As empresas em questão são:

  • WKS Empreendimentos Imobiliários SPE LTDA
  • Via Mais Administradora de Bens LTDA
  • KD Administradora de Bens LTDA
  • Terra Nobre Administradora de Bens LTDAO MP destaca que as companhias são ligadas a Ademar Euclides Monteiro e Marcos Antônio Alberti. A não ser a WKS, as outras três têm como contador Jose Pereira César.

    Os promotores destacaram que José Pereira "montou todo o arcabouço de empresas e pessoas fiscais no entorno do padre Robson e das Afipes, atuando para regularizar as questões administrativas e fiscais".

    G1 contatou a defesa de Ademar e Marcos Antônio por mensagem de texto e aguarda retorno. A reportagem não localizou o representante de José Pereira até a publicação desta reportagem.

    Conforme as investigações, a Afipe deu como forma de pagamento à KD Administradora, um imóvel pelo valor de R$ 1,35 milhão. No entanto, o mesmo imóvel foi avaliado em R$ 2 milhões para fins fiscais e, menos de dois meses depois, hipotecado pelo valor de R$ 7,35 milhões.

    O MP alega que a negociação "traz sérios indícios sobre sua licitude", uma vez que a Afipe adquiriu tal imóvel em 2013 e o repassou como pagamento, cinco anos depois, pelo mesmo valor.

    Outra negociação nos mesmos moldes mostra que a Afipe transferiu uma área à empresa no valor de R$ 485 mil. O terreno havia sido cedido à entidade em 2010 e repassada à companhia, oito anos depois, pelo mesmo valor.

    Outra empresa que fez negócios milionários com a Afipe foi a Terra Nobre. A transação refere-se a uma fazenda em Abadiânia, no Entorno do DF. Ela foi adquirida pela Afipe em 2016 por R$ 6,3 milhões e vendida para a empresa, três anos depois, pelo mesmo montante.

    Já com a WKS, recebeu da Afipe mais de R$ 32,6 milhões em um período de quase um ano e meio. Chamou a atenção dos investigadores o fato de que o primeiro pagamento feito pela entidade foi realizado apenas um dia após a abertura da pessoa jurídica junto à Receita Federal.

    Não há no processo quais transações teriam sido realizadas com a Via Mais.

    Entenda o caso

    • No dia 21 de agosto, o MP deflagrou a Operação Vendilhões, que apura desvios de verba e lavagem de dinheiro na Afipe
    • A ação apura o uso de dinheiro da Afipe - em sua grande maioria doado por fiéis - na compra de fazendas, casas de praia e outros imóveis de luxo. O MP afirma que eram usados "laranjas" e empresas de fachada para a prática dos crimes
    • Um processo de extorsão sofrido pelo padre Robson originou a ação do MP. A Justiça afirma que um hacker extorquiu o pároco tinha um romance com ele e ameaçava expor casos.
    • A investigação aponta que a Afipe movimentou cerca de R$ 2 bilhões na última década. Ao menos R$ 120 milhões teriam sido desviados
    • Fundador e presidente da Afipe, padre Robson se afastou do cargo por conta da operação. Ele era o responsável por gerir um orçamento de R$ 20 milhões mensais.
    • Nota da defesa do padre Robson:

      Todas as operações com essas empresas estão relacionadas com a compra da TV Pai Eterno e estão contabilizadas na escrituração da Afipe. O patrimônio imobiliário foi dado como forma de pagamento. As escrituras confirmam a finalidade: dação em pagamento (modalidade prevista no Código Civil onde o credor recebe a totalidade ou parte do crédito em bens e imóveis) para compra das cotas. Todas as aquisições foram legais e legítimas. Não houve nenhuma transferência irregular de imóvel para essas empresas e tudo ficará comprovado no decorrer das investigações.