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O que Trump e Putin querem da reunião no Alasca?
Putin tem sido consistente em seu objetivo de conquistar território ucraniano, enquanto Trump não esconde o desejo de atuar como mediador da paz em escala global

O presidente dos EUA, Donald Trump, e o presidente da Rússia, Vladimir Putin, viajarão para a cúpula de sexta-feira, no estado americano do Alasca, com prioridades distintas, enquanto se preparam para conversas sobre o fim da guerra da Rússia na Ucrânia.
Putin tem sido consistente em seu objetivo de conquistar território ucraniano, enquanto Trump não esconde o desejo de atuar como mediador da paz em escala global.
Mas ambos também podem enxergar outras oportunidades, como, no caso de Putin, a reabilitação diplomática no cenário internacional. Já prever as intenções de Trump é mais difícil, pois ele tem feito declarações vacilantes recentemente sobre seu homólogo russo.
A seguir, um panorama mais detalhado do que os dois líderes podem buscar no encontro.Putin busca reconhecimento internacional.
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Por Steve Rosenberg, editor de Rússia
A primeira coisa que Putin quer desta cúpula é algo que ele já conseguiu.
E isso é reconhecimento.
Reconhecimento, por parte do país mais poderoso do mundo — os Estados Unidos —, de que os esforços do Ocidente para isolar o líder do Kremlin fracassaram.
O simples fato de essa reunião de alto nível acontecer já é prova disso, assim como a coletiva de imprensa conjunta anunciada pelo Kremlin. Moscou pode argumentar que a Rússia está de volta à mesa principal da política global.
"Então é isso que chamam de isolamento", ironizou o tabloide Moskovsky Komsomolets no início desta semana.
Putin não apenas garantiu uma cúpula EUA-Rússia, mas também um local estratégico para realizá-la. O Alasca oferece muito ao Kremlin.
Primeiro, segurança. No ponto mais próximo, o Alasca continental fica a apenas 90 km (55 milhas) de Chukotka, na Rússia. Vladimir Putin pode chegar lá sem sobrevoar nações "hostis".
Segundo, está muito distante — mas muito distante — da Ucrânia e da Europa. Isso agrada ao Kremlin, que busca deixar Kyiv e os líderes da União Europeia de lado para negociar diretamente com os Estados Unidos.
Há também o simbolismo histórico. O fato de a Rússia czarista ter vendido o Alasca para os EUA no século XIX está sendo usado por Moscou para justificar sua tentativa de mudar fronteiras à força no século XXI.
"O Alasca é um exemplo claro de que fronteiras estatais podem mudar e de que grandes territórios podem mudar de dono", escreveu o Moskovsky Komsomolets.
Mas Putin quer mais do que reconhecimento internacional e simbolismo.
Ele quer vitória. Vem insistindo que a Rússia mantenha todas as terras que ocupou em quatro regiões ucranianas (Donetsk, Luhansk, Zaporizhzhia e Kherson) e que Kyiv se retire das partes dessas regiões ainda sob controle ucraniano.
Para a Ucrânia, isso é inaceitável. "Os ucranianos não entregarão sua terra ao ocupante", afirma o presidente Volodymyr Zelensky.
O Kremlin sabe disso. Mas, se conseguir o apoio de Trump para suas exigências territoriais, o cálculo pode ser que a recusa da Ucrânia leve Trump a cortar todo o apoio a Kyiv. Nesse cenário, Rússia e EUA poderiam seguir fortalecendo relações e desenvolvendo cooperação econômica.
Há, porém, outro cenário.
A economia russa está sob pressão. O déficit orçamentário cresce e a receita com exportações de petróleo e gás cai.
Se os problemas econômicos estiverem pressionando Putin a encerrar a guerra, o Kremlin pode ceder em alguns pontos.
Por enquanto, não há sinal disso — autoridades russas continuam insistindo que a Rússia mantém a iniciativa no campo de batalha.
Trump busca oportunidade para reivindicar avanços rumo à paz
Por Anthony Zurcher, correspondente para a América do Norte
Trump prometeu de forma famosa, durante sua campanha presidencial de 2024, que encerrar a guerra na Ucrânia seria fácil e que poderia fazê-lo em poucos dias.
Essa promessa tem marcado os esforços do presidente americano para resolver o conflito, já que ele tem alternado entre frustração com os ucranianos e com os russos desde que retornou à Casa Branca em janeiro.
Ele repreendeu Zelensky em uma reunião dramática na Casa Branca em fevereiro e, posteriormente, suspendeu temporariamente a ajuda militar e o compartilhamento de informações com a nação devastada pela guerra.
Nos últimos meses, tem sido mais crítico à intransigência de Putin e à disposição dele de atacar alvos civis, estabelecendo uma série de prazos para novas sanções contra os russos e outras nações que negociam com eles. A última sexta-feira marcou o prazo mais recente e, como nos anteriores, Trump acabou recuando.
Agora, ele recebe o presidente russo em solo americano e fala sobre "troca de territórios", que a Ucrânia teme poder significar concessões de terra em troca da paz.
Assim, qualquer discussão sobre o que Trump deseja nas conversas de sexta-feira com Putin é ofuscada pelas declarações e ações vacilantes do presidente.
Esta semana, Trump fez um esforço concentrado para reduzir as expectativas em relação a esta reunião — talvez um reconhecimento tácito das possibilidades limitadas de um avanço com apenas uma das partes da guerra presente.
Na segunda-feira, ele disse que a cúpula seria um encontro de "sondagem". Sugeriu que saberia se poderia fechar um acordo com o líder russo "provavelmente nos dois primeiros minutos".
"Posso sair e dizer boa sorte, e isso será o fim", acrescentou. "Posso dizer que isso não vai ser resolvido."
Na terça-feira, a secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, reforçou essa mensagem, chamando a cúpula de uma "sessão de escuta".
Com Trump, muitas vezes é melhor esperar o inesperado. E Zelensky e líderes europeus conversaram com ele na quarta-feira numa tentativa de garantir que ele não feche um acordo com Putin que a Ucrânia não queira — ou não possa — aceitar.
Uma coisa ficou clara praticamente o ano todo: Trump gostaria de ser o homem que encerra a guerra.
Em seu discurso de posse, disse que queria que seu legado mais orgulhoso fosse o de "mediador da paz". Não é segredo que ele almeja o reconhecimento internacional de um Prêmio Nobel da Paz.
Trump não é de se prender a detalhes. Mas, se houver oportunidade de afirmar que avançou rumo à paz durante as conversas em Anchorage, ele a aproveitará.
Putin, sempre um negociador astuto, pode buscar uma forma de permitir que Trump faça exatamente isso — é claro, nos termos da Rússia.