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Amiga de Lulinha na mira da PF: o que se sabe sobre acusações contra filho do presidente na CPMI que investiga fraudes no INSS

A nova fase deflagrada pela Polícia Federal na quinta-feira (18) como parte da Operação Sem Desconto trouxe à tona pagamentos que somam R$ 1,5 milhão feitos por ordem do lobista Antônio Carlos Camilo Antunes, conhecido como "careca do INSS"

PEDRO RIBEIRO/DA EDITORIA/COM BBC 19/12/2025
Amiga de Lulinha na mira da PF: o que se sabe sobre acusações contra filho do presidente na CPMI que investiga fraudes no INSS
Imagem divulgada pela Polícia Federal na nova fase da Operação Sem Desconto | Polícia Federal

A nova fase deflagrada pela Polícia Federal na quinta-feira (18) como parte da Operação Sem Desconto trouxe à tona pagamentos que somam R$ 1,5 milhão feitos por ordem do lobista Antônio Carlos Camilo Antunes, conhecido como "careca do INSS", a uma empresária próxima de Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, filho mais velho do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

A empresária é Roberta Luchsinger, que foi alvo de um dos mandados de busca e apreensão dessa nova fase da operação que investiga o esquema de descontos irregulares aplicados a benefícios do INSS — que resultou na prisão do "número 2" do Ministério da Previdência, Adroaldo da Cunha Portal. O senador Weverton Rocha (PDT-MA), vice-líder do governo Lula no Senado, também foi alvo de mandados de busca e apreensão.

Uma das transferências feitas a Luchsinger, no valor de R$ 300 mil, foi citada em mensagens que constam na investigação da PF nas quais Antunes afirma que o dinheiro seria destinado ao "filho do rapaz". Segundo o jornal Folha de S.Paulo, os investigadores tentam esclarecer se a referência diz respeito a Lulinha.

O filho do presidente não é investigado no caso. Mas as novas informações reforçam os argumentos de deputados da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que apura um esquema bilionário de fraudes no sistema do INSS que querem sua convocação para prestar esclarecimentos.

Questionado sobre o assunto na quinta-feira, Lula declarou que "todas as pessoas envolvidas" no esquema de desconto ilegal de benefícios do INSS seriam investigadas.

"Ninguém ficará livre. Se tiver filho meu metido nisso, ele será investigado", afirmou.

Segundo a Polícia Federal, os pagamentos feitos por ordem de Antunes foram destinados à empresa RL Consultoria e Intermediações, que tem Luchsinger como sócia.

Os repasses teriam partido da Brasília Consultoria Empresarial Ltda., apontada como empresa de fachada ligada ao grupo de Antunes, e teriam como justificativa serviços que não foram efetivamente prestados.

A investigação da PF aponta que a empresária atuaria como integrante vinculada ao núcleo político da organização criminosa investigada, com papel considerado essencial na ocultação de patrimônio, na movimentação de valores e na gestão de estruturas empresariais usadas para lavagem de dinheiro.

A investigação também aponta que ela seria um dos elos entre Lulinha e Antônio Carlos Camilo Antunes em projetos na área da saúde.

Em mensagens analisadas pela PF, Luchsinger relata a Antunes que "acharam um envelope com nome do nosso amigo no dia da busca e apreensão" e o orienta a se desfazer de telefones. Em outro momento, envia um áudio tentando tranquilizá-lo e menciona que, "na época do Fábio", também teriam surgido acusações semelhantes, ligadas à empresa Friboi.

Imagem divulgada pela Polícia Federal na nova fase da Operação Sem Desconto

Crédito,Polícia Federal

Legenda da foto,Imagem divulgada pela Polícia Federal na nova fase da Operação Sem Desconto

As novas informações surgem duas semanas depois que a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que apura um esquema bilionário de fraudes no sistema do INSS rejeitou a convocação de Lulinha para prestar esclarecimentos.

O requerimento havia sido apresentado por parlamentares do partido Novo, que alegaram haver indícios financeiros de uma possível ligação entre operadores do esquema e pessoas próximas ao presidente da República, entre elas o filho de Lula.

O pedido já estava previsto na pauta da CPMI, mas ganhou força após os integrantes da comissão terem acesso ao depoimento de uma testemunha que afirmava que Lulinha teria recebido uma "mesada" de Antunes, que foi preso em setembro.

Segundo as investigações, Antônio Carlos Camilo Antunes era um dos principais operadores do esquema e atuava como intermediário entre sindicatos e associações e servidores do INSS, recebendo valores descontados indevidamente de aposentados e pensionistas e repassando parte dos recursos a funcionários do instituto, familiares e empresas ligadas a eles.

Apesar da pressão da oposição, a base governista conseguiu barrar a convocação no início de dezembro. O requerimento foi rejeitado por 19 votos a 12.

O deputado Paulo Pimenta (PT-RS), ex-ministro da Secretaria de Comunicação Social, afirmou que o pedido estava fora de propósito e que não havia provas que ligassem Lulinha ao esquema.

Em outubro, a CPMI já havia rejeitado a convocação de José Ferreira da Silva, o Frei Chico, irmão do presidente Lula. Ele foi vice-presidente do Sindnapi, entidade investigada no caso, mas não é alvo das apurações da Polícia Federal.

Na noite de quinta-feira (18/12), o deputado Marcel van Hattem (Novo-RS) afirmou em suas redes sociais haver protocolado novo pedido de convocação do filho do presidente e a prorrogação da CPMI por mais 120 dias.

Acusações na CPMI

Na terça-feira (2/12), o presidente da CPMI do INSS, senador Carlos Viana (Podemos-MG) anunciou, em uma publicação nas redes sociais, que colocaria em votação um requerimento para convocar Lulinha.

Ele afirmou: "Quem não deve, não teme. O Brasil quer respostas".

O pedido, assinado pelos deputados Marcel van Hattem (Novo-RS), Eduardo Girão (Novo-CE), Adriana Ventura (Novo-SP) e Luiz Lima (Novo-RJ), alegava que ouvir Lulinha era essencial para esclarecer "eventual uso de sua estrutura contábil ou possível ligação indireta com o esquema".

Segundo o jornal O Globo, o gatilho para o pedido foi a revelação de que Ricardo Bimbo, dirigente nacional do PT, teria recebido dinheiro de uma das empresas investigadas.

No mesmo período, ele teria quitado um boleto do contador João Muniz Leite, responsável pelas contas de Lulinha.

A pressão para convocar o filho de Lula aumentou após a CPMI tomar conhecimento do depoimento de Edson Claro, ex-funcionário do INSS, à Polícia Federal.

Segundo o portal Poder360, que teve acesso ao depoimento, Claro acusa Lulinha de manter uma relação de proximidade e até uma sociedade empresarial com Antônio Carlos.

Ele teria dito que o filho de Lula recebeu uma cifra de 25 milhões (sem especificar em qual moeda) do "careca do INSS", além de uma "mesada" de R$ 300 mil.

Ainda, de acordo com o depoimento de Claro, Lulinha atuava como uma espécie de lobista para Antônio Carlos e eles teriam viajado juntos várias vezes para Portugal.

Edson Claro é um dos alvos da investigação da Polícia Federal. Ele prestou depoimento em 29 de outubro de 2025.

De acordo com o Poder360, não fica claro o tipo de sociedade que Lulinha tem ou pode ter mantido com o "careca do INSS" com base no que diz Edson Claro.

Apesar disso, o veículo pontua que as citações ao filho de Lula na investigação são fartas. Ele é citado em conversas de WhatsApp em situações que poderia ajudar, de alguma forma, os acusados de fraudar o INSS.

Quem é Lulinha

Fábio Luis, mais conhecido como Lulinha, é o filho mais velho de Lula com Marisa Letícia. Ele é formado em biologia e chegou a trabalhar como estagiário em um zoológico em São Paulo. Hoje ele tem empresas no ramo de tecnologia.

Nos anos 2000, o filho de Lula se tornou sócio da empresa Gamecorp, que atuava no ramo de jogos eletrônicos.

Em 2019, o Ministério Público Federal denunciou Lulinha e outras 10 pessoas por suposto recebimento de vantagens indevidas da Oi/Telemar, entre 2004 e 2016.

Em 2020, ele foi alvo da Operação Lava Jato, investigado por suspeita de receber repasses de mais de R$ 100 milhões do grupo Oi/Telemar para suas empresas, em troca de decisões favoráveis do governo durante as gestões petistas.

O caso foi arquivado.

Em julho, o portal Metrópoles divulgou que Lulinha se mudou para a Espanha e só voltaria ao Brasil após o fim do mandado de Lula. Ele teria sido contratado para trabalhar para uma empresa em Madri.

Fraude no INSS

Em abril, uma investigação conjunta da Controladoria-Geral da União (CGU) e da Polícia Federal (PF) revelou uma fraude bilionária no INSS, que roubou centenas de milhares de aposentados por meio de descontos não autorizados em seus benefícios.

Segundo a polícia, sindicatos e associações de aposentados conseguiam, por meio de convênios com o INSS, descontar mensalidades de aposentados e pensionistas sem autorização.

Estima-se que o esquema envolva R$ 6,3 bilhões em descontos, entre valores legais e ilegais, no período de 2019 a 2024.

Entre os investigados na primeira fase da Operação estavam seis servidores públicos, incluindo o então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto. Ele foi demitido do cargo após a operação e preso em novembro.

Em setembro, novas prisões foram feitas, entre elas do empresário Antônio Carlos Camilo Antunes, o "careca do INSS".

Ele é apontado pelas investigações como facilitador do esquema que desviou recursos de aposentados e pensionistas.

Segundo a Polícia Federal, empresas ligadas a ele teriam operado como intermediárias financeiras das associações investigadas na fraude.