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Censo 2022: quais são os 9 municípios do Brasil onde autodeclarados pretos são maioria

Segundos especialistas, a mudança reflete fatores demográficos e também a valorização das identidades negra e indígena nos últimos anos

PEDRO RIBEIRO/DA EDITORIA/COM BBC 22/12/2023
Censo 2022: quais são os 9 municípios do Brasil onde autodeclarados pretos são maioria
Muitas das cidades com predominância de população preta têm presença relevante de quilombolas na sua população, revelam dados do Censo | WEVERSON PAULONO/AGÊNCIA BRASIL

Localizado a 118 km de São Luís, no litoral noroeste do Maranhão, Serrano do Maranhão é o município "mais preto" do Brasil, revelam dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) nesta sexta-feira (22/12).

O município de pouco mais de 10 mil habitantes é um dos nove do país onde a população preta é predominante (representando 58% do total), superando o percentual de pardos (39%), brancos (2,7%), indígenas e amarelos (menos de 0,1%), segundo dados do Censo Demográfico de 2022.

Em 2010, ano do Censo anterior, apenas dois municípios brasileiros tinham predominância preta, segundo o IBGE: Antônio Cardoso (BA) e Lajeado (TO).

Em 2022, já eram nove, sendo oito deles na Bahia — Antônio Cardoso, Cachoeira, Conceição da Feira, Ouriçangas, Pedrão, Santo Amaro, São Francisco do Conde e São Gonçalo dos Campos —, além de Serrano do Maranhão.

Vale lembrar que a Bahia é o Estado brasileiro que concentra a maior parcela de quilombolas do país (29,9% do total) — nome dado aos remanescentes de quilombos, comunidades formadas por escravos fugitivos na época da escravidão no Brasil.

Em seguida, vem o Maranhão, onde vivem 20,3% dos quilombolas do país.

Muitas das cidades com predominância de população preta têm presença relevante de quilombolas e descendentes de escravizados na sua população.

Na última edição do Censo, em relação a 2010, diminuiu o número de municípios com predominância branca, de 2.552 para 2.283, uma queda de 11%.

Na direção oposta, aumentou o número de municípios com predominância parda (de 2.990 para 3.245, alta de 9%), preta (de 2 para 9, avanço de 350%) e indígena (de 21 para 33, alta de 57%).

Segundos especialistas, a mudança reflete fatores demográficos e também a valorização das identidades negra e indígena nos últimos anos.

Confira um pouco da história dos nove municípios brasileiros onde pretos são o grupo étnico-racial predominante, uma das novidades da edição 2022 do Censo.

Antônio Cardoso/BA

Quilombolas da comunidade de Paus Altos, em Antônio Cardoso, Bahia

CRÉDITO,DIVULGAÇÃO

Legenda da foto,

Quilombolas da comunidade de Paus Altos, em Antônio Cardoso, na Bahia


Santo Amaro, cidade onde nasceram os cantores Caetano Veloso e Maria Bethânia, tem 56 mil habitantes, sendo 50,9% de autodeclarados pretos, 43,1% de pardos, 5,8% de brancos e menos de 1% de amarelos e indígenas, segundo o Censo 2022.Da população, 6,9 mil se declaram quilombolas, ou 12,4% do total, diz o IBGE.A resistência negra de Santo Amaro foi imortalizada por Caetano Veloso em músicas como 13 de Maio, em que ele canta: "Dia 13 de maio, em Santo Amaro, na Praça do Mercado, os pretos celebravam (talvez hoje inda o façam) o fim da escravidão".


O município abriga comunidades quilombolas como Alto do Cruzeiro-Acupe, Barro Velho, Barro Vermelho, Caeira, Cambuta, São Braz e Subaé.São Francisco do Conde/BA.


O nome do município homenageia o padroeiro da cidade e um conde de nome Fernão Rodrigues, que herdou o terreno do terceiro governador-geral do Brasil, Mem de Sá.Com 38,7 mil habitantes, São Francisco do Conde tem 49,9% de população preta, 44,1% de pardos, 5,7% de brancos e menos de 1% de amarelos e indígenas, segundo o Censo 2022 do IBGE.


Dentro de seus limites, estão comunidades quilombolas como Ilha do Paty, Monte Recôncavo e Porto de Dom João – são 2,2 mil autodeclarados quilombolas no município, ou 5,8% da população total.São Gonçalo dos Campos/BACom 39,5 mil habitantes, São Gonçalo dos Campos tem 47% de população preta, 45,5% de pardos, 7,3% de brancos e menos de 1% de amarelos e indígenas, segundo o Censo 2022 do IBGE.


Apesar do elevado percentual e população preta e parda, o município soma apenas 69 autodeclarados quilombolas (0,2% da população total), abrigando ao menos uma comunidade quilombola, de nome Bete II.


Única cidade fora da Bahia a ter predominância de autodeclarados pretos, Serrano do Maranhão tinha 10,2 mil habitantes no Censo de 2022, dos quais impressionantes 58% de pretos, 39% de pardos, 2,7% de brancos e menos de 0,1% de indígenas e amarelos, segundo o Censo 2022.


Até 1994, a região fazia parte do município de Cururupu, e era denominada Povoado Serrano, uma das vilas mais antigas do Estado do Maranhão, formado por lavradores, pescadores e quilombolas.Em Serrano do Maranhão, 55,7% da população é quilombola, somando 5,7 mil pessoas — trata-se da quarta cidade com maior proporção de quilombolas do país, atrás apenas de Alcântara/MA (84,6%), Berilo/MG (58,4%) e Cavalcante/GO (57,1%), conforme os dados do IBGE.


O levantamento do MDS conta quase 30 comunidades remanescentes de quilombo em Serrano do Maranhão.


Em 2017, uma reportagem do site Repórter Brasil relatou como a comunidade quilombola Nazaré, em Serrano do Maranhão, rompeu apenas recentemente com o sistema de foro, uma espécie de imposto pago pelos quilombolas aos fazendeiros para poder viver nas terras e plantar."Antes negro deitava no chão pra fazer ponte pra branco passar por cima. Hoje não deita mais porque negro já é sabido", disse José Mário Silva Pinto, do Quilombo Nazaré, à Repórter Brasil.