Política
Ministro do STF suspende nomeação de Alexandre Ramagem para o cargo de diretor-geral da PF
Ramagem, que é amigo da família Bolsonaro, foi escolhido pelo presidente da República para chefiar a PF, em substituição a Maurício Valeixo.
A demissão de Valeixo por Bolsonaro levou à saída do então ministro da Justiça Sergio Moro, que acusou o presidente de tentar interferir politicamente na Polícia Federal.
Ao suspender a nomeação, Moraes citou as alegações de Moro e afirmou que há indício de desvio de finalidade na escolha de Ramagem, "em inobservância aos princípios constitucionais da impessoalidade, da moralidade e do interesse público". O desvio de finalidade ocorre quando um ato do poder público não atende os princípios que deveria obedecer.
Moraes destacou na decisão as afirmações do ex-ministro da Justiça de que Bolsonaro queria "ter uma pessoa do contato pessoal dele” no comando da PF, “que pudesse ligar, colher informações, colher relatórios de inteligência”.
O ministro do STF afirmou em seguida que o próprio Bolsonaro confirmou que gostaria de receber informações da PF, no pronunciamento que o presidente fez horas após a demissão de Moro.
Na sequência, Moraes cita com mais detalhes o trecho da fala de Bolsonaro:
Moraes também lembrou que, no mesmo dia, o ministro Sergio Moro apresentou imagens de conversas de celular com o presidente. As imagens, exibidas no Jornal Nacional, mostram Bolsonaro compartilhando um link do site "O Antagonista" que noticiava: “PF na cola de 10 a 12 deputados bolsonaristas.”
Embaixo, o presidente escreveu: “Mais um motivo para a troca”, se referindo à mudança na direção da Polícia Federal.
O ministro ainda incluiu na decisão outras imagens mostradas por Moro: as que trazem conversa entre ele e a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP). Na conversa, ela diz: "Por favor, ministro, aceite o Ramage", numa referência a Alexandre Ramagem, diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Ramagem é um dos candidatos de Jair Bolsonaro para a Direção-Geral da Polícia Federal.
Parte da deputada a proposta para que Sergio Moro aceite a mudança na PF em troca da nomeação dele para o Supremo Tribunal Federal.
"E vá em setembro pro STF", enviou a deputada. "Eu me comprometo a ajudar", acrescentou. "A fazer JB prometer", completou.
Sergio Moro, então, rechaça a proposta: "Prezada, não estou à venda".
O ministro do STF afirmou que os fatos dos últimos dias são justificativa suficiente para suspender a nomeação de Ramagem.
Questionado sobre a decisão de Moraes, o Palácio do Planalto não havia se pronunciado até a última atualização desta reportagem.
A proximidade de Ramagem com a família Bolsonaro causou contestações no meio político à escolha dele para chefiar a PF.
A relação com o presidente e os filhos dele começou na eleições de 2018, quando Ramagem chefiou a equipe de segurança do então candidato Bolsonaro. Candidatos tem direito à segurança da PF.
Na réveillon de 2019, Ramagem foi fotografado em festa ao lado do filho do presidente Carlos Bolsonaro, que é vereador do município do Rio de Janeiro.
O ministro disse ainda que a função do poder Judiciário é impedir atos "incompatíveis" com a Constituição. Ele disse que nomeações para cargos públicos devem respeitar os princípios da moralidade, impessoalidade e interesse público, o que, segundo o ministro, não ocorreu no caso de Ramagem.
Outras nomeações barradas na Justiça
Não é a primeira vez que o STF suspende nomeações do presidente da República: em 2016, o ministro Gilmar Mendes barrou a ida de Lula para a Casa Civil do governo Dilma Roussef (2011-2016), a pedido do então PPS (hoje Cidadania). A decisão é citada por Moraes na liminar sobre Ramagem.
Em 2018, a ministra Cármen Lúcia suspendeu a posse de Cristiane Brasil no ministério do Trabalho do governo Temer, após o G1 revelar que ela havia sido condenada em uma ação trabalhista.
Perfil
Na Polícia Federal, Ramagem comandou as divisões de Administração de Recursos Humanos e de Estudos, Legislações e Pareceres, e atuou na área de coordenação de eventos como a Copa do Mundo de 2014, a Olimpíada de 2016 e a Rio+20, Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente.
Em março de 2019, ainda no início do mandato de Bolsonaro, o delegado foi nomeado assessor do então ministro Santos Cruz na Secretaria de Governo – pasta que fica no Palácio do Planalto.
Ramagem foi mantido na secretaria, como assessor do novo ministro, Luiz Eduardo Ramos, após a demissão de Santos Cruz, em junho de 2019.
No mês seguinte, em julho, o delegado foi escolhido por Bolsonaro para ser diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que é vinculada ao gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência, comandada pelo ministro Augusto Heleno. Segundo o GSI, a Abin produz informações para embasar decisões do presidente da República de forma rápida.
Na posse na Abin, o presidente se referiu a ele como "um amigo que conheci há pouco tempo".