Política
Gilmar Mendes altera lei e veta Senado de pedir impeachment de ministros do Supremo
O temor é de que a decisão atrapalhe ainda mais a já conturbada sabatina do advogado-geral da União, Jorge Messias, indicado para ministro do STF
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes suspendeu nesta quarta-feira (3/12) diversos trechos da Lei do Impeachment relativos ao afastamento de ministros da corte, restringindo à Procuradoria Geral da República (PGR) a prerrogativa de entrar com um pedido de impeachment contra os magistrados.
Em entrevista à BBC News Brasil no mês passado, o ministro já havia dito que pretendia julgar ainda neste ano uma ação protocolada na Corte que questiona a norma.
Para Mendes, a legislação, de 1950, já tinha muitos pontos revogados. "É um contraste da lei dos anos 50 com vários textos constitucionais, inclusive a Constituição de 88", disse o ministro.
A decisão é em caráter liminar, mas será levada ao plenário do STF em sessão virtual agendada para começar no próximo dia 12 e se encerrar no dia 19.
Na decisão, Mendes, que é o decano da corte, atribuiu à PGR — e somente a ela — a prerrogativa de pedir o impeachment de algum ministro da corte. Hoje a lei estabelece que qualquer cidadão pode fazê-lo.
Outro ponto alterado por Mendes foi o quórum necessário para a abertura de um processo contra ministros da corte no Senado: 2/3. Hoje, a lei prevê maioria simples, ou seja, 21 senadores.
Mendes estabeleceu também que não é possível responsabilizar ou instaurar processo de impeachment contra os magistrados com base somente no mérito de suas decisões.
"A intimidação do Poder Judiciário por meio do impeachment abusivo cria um ambiente de insegurança jurídica, buscando o enfraquecimento desse poder, o que, ao final, pode abalar a sua capacidade de atuação firme e independente", diz o ministro na decisão.
O ministro acompanhou ainda um parecer da PGR que defendeu a não recepção dos artigos referentes ao afastamento temporário de ministros. Segundo a decisão, ao contrário do presidente da República, um ministro do Supremo não tem substituto, e sua ausência pode comprometer o funcionamento do tribunal.
A decisão ocorre em meio a uma crise entre o Planalto e o Senado, justamente devido à escolha do novo ministro do Supremo.
Na terça-feira (2/12), o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil - AP) cancelou a sabatina do advogado-Geral da União, Jorge Messias, escolhido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para substituir Luís Roberto Barroso no STF.

Crédito,Luiz Silveira/STF
A sabatina estava prevista para a quarta-feira (10/12) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, seguida por votação no plenário. O rito faz parte de toda indicação de um novo ministro da corte.
Porém, Lula não enviou ao Senado, até o momento, a mensagem formalizando a sua indicação, o que inviabiliza a apreciação em tempo hábil pelo presidente da CCJ, Otto Alencar (PSD-BA).
A suspensão da sabatina tem como pano de fundo a escolha de Messias enquanto Alcolumbre apoiava a indicação de seu aliado, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
A escolha de Lula "azedou o clima político" segundo afirmou um ministro do STF em caráter reservado à BBC News Brasil no dia da escolha de Lula.
Antes de deixar a corte, Barroso também havia sinalizado que a Corte poderia vir a barrar eventuais tentativas de impeachment contra seus ministros.
Em conversa com jornalistas que cobrem o Supremo, ocorrida em setembro, o ex-ministro ressaltou que a Corte tem a atribuição de fazer "o controle de constitucionalidade" de processos de impeachment.
E defendeu que a cassação de ministros do STF só poderia ser realizada em caso de crimes graves, como corrupção, e não por discordância dos seus votos e decisões.
"O impeachment é [um mecanismo disponível] se tiver acontecido um episódio grave, de corrupção. Um impeachment não é um produto de prateleira para você se livrar de alguém de quem você não goste politicamente", disse ele.