Política

Sem prestar concurso, ex-vereador é efetivado na ALMT e tem cargo anulado após 20 anos: “desrespeito à Constituição”, diz juiz

José Antunes de França ocupou cargo efetivo na Assembleia Legislativa de Mato Grosso por duas décadas sem ter feito concurso público. Justiça classificou o caso como afronta à Constituição de 1988

PEDRO RIBEIRO/DA EDITORIA/COM COM TJ-MT/COM G1-MT 06/06/2025
Sem prestar concurso, ex-vereador é efetivado na ALMT e tem cargo anulado após 20 anos: “desrespeito à Constituição”, diz juiz
José Antunes de França, ex-vereador de Castanheira (MT), que ocupava, desde o início dos anos 2000, um cargo efetivo na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) | AL-MT

Um caso que simboliza o desrespeito à Constituição Federal veio à tona na quinta-feira (5), após o juiz Juliano Hermont Hermes da Silva determinar a anulação da estabilidade no serviço público de José Antunes de França, ex-vereador de Castanheira (MT), que ocupava, desde o início dos anos 2000, um cargo efetivo na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) sem jamais ter prestado concurso público.

José Antunes, atualmente com 60 anos, foi nomeado em 1999 para um cargo comissionado de assessor parlamentar. Apenas dois anos depois, em 2001, obteve efetivação indevida, com base em interpretação equivocada do artigo 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da Constituição Federal. Tal dispositivo visava regularizar situações de servidores em exercício desde antes da promulgação da Constituição de 1988 — o que não era o caso do ex-vereador, já que seu ingresso no serviço público ocorreu onze anos após o prazo constitucional.

Mesmo sem cumprir os requisitos mínimos exigidos, José Antunes foi efetivado como Assistente de Apoio Legislativo e posteriormente reenquadrado como Técnico Legislativo de Nível Médio, recebendo progressões salariais, vantagens e benefícios exclusivos de servidores concursados — tudo sem nunca ter se submetido a concurso público.

Na sentença, o juiz classificou a situação como um “exemplo claro de violação à Constituição” e destacou que o caso demonstra o quanto a legalidade e o princípio do concurso público foram ignorados por agentes da administração pública.

“Não houve qualquer concurso público. A estabilidade foi obtida com base em interpretação inconstitucional. Isso é desrespeitar a Constituição de forma escancarada”, afirmou o magistrado.

A decisão declara vago o cargo ocupado por José Antunes, corrigindo o que foi considerado um ato administrativo inconstitucional. No entanto, a aposentadoria por tempo de contribuição já concedida ao ex-vereador foi mantida, com base em decisões anteriores do Supremo Tribunal Federal (STF), que protegem situações consolidadas de boa-fé quando há o transcurso de longo tempo e concessão do benefício previdenciário.

O caso levanta mais uma vez o debate sobre efetiva moralização do serviço público e o uso político de cargos comissionados como meio de burlar os princípios constitucionais, como o da igualdade de acesso e do concurso público, previstos no artigo 37 da Constituição Federal.

A sentença ainda cabe recurso, mas já repercute nos bastidores do Legislativo como um alerta à tolerância histórica com irregularidades no funcionalismo público.