Política
“Dinastia deixou a cidade sem água por mais de 30 anos”, dispara Tião da Zaeli sobre legado dos Campos em Várzea Grande
O atual vice-prefeito Sebastião Gonçalves, o Tião da Zaeli (PL), foi categórico ao apontar a responsabilidade das gestões anteriores

Por mais de meio século, o destino político de Várzea Grande esteve sob o domínio da família Campos, cuja dinastia começou com Júlio Domingos de Campos (Fiote) e se perpetuou com filhos e primos no comando da Prefeitura e em cargos estaduais.
A família chegou a transformar Várzea Grande em um verdadeiro reduto eleitoral, mas, segundo críticos, deixou um legado de omissão em relação a problemas básicos da população, como o abastecimento de água.
O atual vice-prefeito Sebastião Gonçalves, o Tião da Zaeli (PL), empresário do setor alimentício e imobiliário, natural de Minas Gerais, foi categórico ao apontar a responsabilidade das gestões anteriores pelo drama hídrico da cidade. Em entrevista - na semana que passou - para a TV Record de Cuiabá, Tião lamentou as décadas de promessas não cumpridas:
“Eu acredito em tudo, Várzea Grande. Até porque nós temos aí um histórico político que é uma dinastia, vamos dizer assim, mandou por décadas. Porque esse grupo deixou a cidade sem água durante mais de 30 anos. Se eles tivessem interesse, teria resolvido, porque o rio passa dentro da cidade. Mas vamos olhar para frente e se eles quiserem colaborar, sejam bem-vindos, mas por favor, não atrapalhem, porque é um sofrimento da população”, afirmou.
Veja as promessas sobre a questão hídrica em VG sob a dinastia Campos
1960 — Prefeito Júlio Domingos de Campos (Fiote)
Primeiros planos de captação de água no Rio Cuiabá (não executados).
1976-1983 — Prefeito Júlio Campos
Projeto: Ampliação e Modernização do Sistema de Abastecimento
- Nova estação de captação no Rio Cuiabá (parcialmente construída e desativada).
- Substituição de redes antigas no centro histórico.
- Meta de 100% de cobertura até 1982 (não alcançada).
1997-2004 — Prefeito Jaime Campos(2º mandato)
Programa: Água Para Todos
- Promessa de universalização e fim do rodízio.
- Prevista construção de reservatórios (não saiu do papel).
- Ampliada rede em pontos isolados; bairros periféricos seguiram no rodízio.
2009-2012 — Prefeito Jaime Campos (2º mandato)
Plano Diretor do DAE
- Promessa: gestão técnica, redução de perdas em 30%.
- Plano elaborado, mas obras estruturantes não iniciadas.
- Perdas na rede seguiram acima de 50%.
2015-2020 — Prefeita Lucimar Sacre de Campos
Projeto: Modernização da Captação e Ampliação de Rede
- Promessa: reduzir rodízio com parcerias privadas.
- Resultados: poucas obras efetivas; rodízio permaneceu.
- Parcerias não resultaram em modernização efetiva.
De acordo com o Departamento de Água e Esgoto de Várzea Grande(DAE/VG), o impacto foi comum em todas as gestões, pois houve rodízio crônico no fornecimento de água para os bairros periféricos: Manga, São Mateus, Parque do Lago, Parque Sabiá e São Simão, além de perdas de água acima de 50% até hoje e de promessas de captação de recursos federais fracassadas
Além disso, ao longo desses mandatos, projetos de modernização do Departamento de Água e Esgoto (DAE) foram anunciados, mas não executados com efetividade.
Veja os projetos dos exs-prefeitos
Júlio Campos
Projeto: Ampliação e Modernização do Sistema de Abastecimento de Água – Gestão Júlio Campos (1976-1983)
Objetivo declarado:
- Construção de nova estação de captação no Rio Cuiabá
- Substituição de redes antigas no centro e nos bairros mais antigos
Promessa:
- Cobertura de 100% da área urbana de Várzea Grande até 1982
Status:
- Parte da estação chegou a ser construída, mas não foi ativada na totalidade.
- Substituição de rede limitada ao centro histórico e áreas comerciais.
Impacto:
- Mínima melhoria no fornecimento; bairros periféricos seguiram desassistidos.
Jaime Campos (1º mandato)
Projeto: Programa Emergencial de Combate ao Desabastecimento – Diversas gestões (anos 1980 a 2000)
Objetivo declarado:
- Manutenção emergencial da rede e perfuração de poços artesianos em áreas críticas
Promessa:
- Reduzir as falhas no fornecimento no curto prazo
Status:
- Poços perfurados em alguns bairros como Jardim Glória e Manga, mas com baixo rendimento e sem manutenção regular.
Impacto:
- Solução temporária e insustentável, que não resolveu o problema estrutural.
Jaime Campos (2º mandato)
Projeto: Programa “Água Para Todos” – Gestão Jaime Campos (1997-2004)
Objetivo declarado:
- Universalização do acesso à água tratada
- Construção de reservatórios e reforço da captação do Rio Cuiabá
Promessa:
- Erradicar o rodízio de abastecimento até o final do mandato
Status:
- Reservatórios previstos não saíram do papel.
- Foram feitas ampliações pontuais na rede, sem impacto na universalização.
Impacto:
- População continuou a depender de rodízio e caminhões-pipa em bairros como São Mateus e Manga.
Jaime Campos (3º mandato)
Projeto: Plano Diretor do DAE – Gestão Jaime Campos (2009-2012)
Objetivo declarado:
- Diagnóstico completo do sistema e planejamento para investimentos até 2020
- Parceria com o governo estadual para obras estruturantes
Promessa:
- Implantar gestão técnica e reduzir perdas na rede em 30%
Status:
- Plano chegou a ser elaborado, mas poucas das obras foram iniciadas.
- A parceria com o governo estadual não se consolidou.
Impacto:
- Índices de perda permaneceram altos (cerca de 50% em 2012).
Promessa da família(irmãos, esposa e primos)
Projeto: Modernização do DAE com Recursos Federais – Tentativa durante diversas gestões dos Campos
Objetivo declarado:
- Obtenção de financiamento federal para reestruturação do DAE
Promessa:
- Modernizar equipamentos, redes e estações com verbas de Brasília
Status:
- Recursos não captados ou projetos rejeitados por falta de documentação e planejamento técnico adequado.
Impacto:
- O sistema manteve equipamentos obsoletos e rede precária.
Ao longo das décadas, conforme informações repassadas ao Página 12 pelo DAE/VG, as gestões da dinastia Campos anunciaram uma série de planos e projetos com foco no abastecimento de água, mas a maioria ficou restrita ao papel, foi executada parcialmente ou fracassou na obtenção de recursos e na continuidade administrativa. O resultado: o problema estrutural se perpetuou e se agravou ao longo dos anos.
Veja os dados atuais da crise da água em VG
Percentual de cobertura de água:
- Várzea Grande (2024): cerca de 60% da população com abastecimento regular.
- Rondonópolis: 95% da população atendida.
- Sinop: 90% da população atendida.
Perdas na rede de distribuição:
- Várzea Grande: até 50% de perda por vazamentos e redes antigas.
- Média nacional: cerca de 35%.
Veja os bairros mais afetados ontem e hoje históricos(anos 1980-2000):
- Jardim Eldorado
- Mapim
- São Mateus
- Manga
- Jardim Glória
- Parque do Lago
Atuais (2024):
- Parque do Lago
- Parque Sabiá
- São Simão
- Manga
- Ipiranga
- Parque das Nações
- Cristo Rei (partes altas)
Cenário atual
- Cobertura de água: 60% da área urbana
- Perdas na rede: 50% (acima da média nacional de 35%)
- Regiões inteiras ainda dependem de caminhões-pipa ou poços artesianos.
Veja a atual situação do DAE
O DAE possui rede defasada, com equipamentos obsoletos, dificuldade de captação no Rio Cuiabá por falta de estações modernas e baixa capacidade de reservação. Muitos bairros recebem água em regime de rodízio, outros dependem de caminhões-pipa em períodos de estiagem.
O Rio Cuiabá, que corta o município, poderia garantir abundância de água para toda a cidade, mas a ausência de investimentos estruturantes perpetuou o problema. Diferentemente de cidades como Rondonópolis e Sinop, que modernizaram seus sistemas com parcerias e obras efetivas, Várzea Grande ficou presa ao atraso.
O apelo do vice-prefeito
Agora, com a concessão do DAE à iniciativa privada em pauta, Tião da Zaeli defende que as antigas forças políticas deixem a nova gestão trabalhar.
“A população já sofreu demais. É hora de superar o passado e buscar soluções reais. Chega de promessas”, concluiu o vice-prefeito.
O discurso de Tião da Zaeli expõe um mal-estar silencioso que há muito tempo incomoda os moradores de Várzea Grande: a sensação de que o poder ficou nas mãos de poucos, e as prioridades ficaram em segundo plano.
Ao atacar o legado da dinastia Campos, Tião não apenas faz um aceno à população sedenta por mudança — como também abre um novo capítulo na disputa pelo futuro político da cidade.