Política

“Brasil poderia estar mais envolvido nas negociações de paz”, diz vice-ministra da Ucrânia à CNN

Iryna Borovets faz referência à Cúpula da Paz sobre a Ucrânia, que aconteceu neste fim de semana, em um resort na Suíça

PEDRO RIBEIRO/DA EDITORIA/COM CNN 16/06/2024
“Brasil poderia estar mais envolvido nas negociações de paz”, diz vice-ministra da Ucrânia à CNN
Vice-ministra de Relações Exteriores da Ucrânia, Iryna Borovets, visitou a CNN às vésperas da conferência suíça | CNN

A vice-ministra de Relações Exteriores da Ucrânia, Iryna Borovets, afirmou à CNN que, apesar dos esforços brasileiros, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) poderia desempenhar um papel maior nas negociações de paz entre o país e a Rússia.

“Nós achamos que, considerando a postura internacional do Brasil e a posição global em que o país se encontra, poderia estar mais envolvido nas negociações de paz”, disse a vice-ministra.

Iryna Borovets faz referência à Cúpula da Paz sobre a Ucrânia, que aconteceu neste fim de semana, em um resort na Suíça.

A vice-ministra visitou a CNN às vésperas da conferência suíça. O presidente Lula foi convidado para o evento, mas recusou, alegando que nenhuma cúpula conseguirá chegar à paz sem o envolvimento dos russos na mesa de negociações.

“Acho que o Brasil pode liderar pelo exemplo e fazer parte do processo que vamos iniciar agora na Suíça, na conferência pela paz mundial, onde cerca de 100 líderes estarão presentes”, afirmou Iryna.

A maioria dos 90 países que participaram da conferência apoiou a declaração final do evento, disse a presidente suíça Viola Amherd neste domingo (16).

O conteúdo do comunicado final requer a utilização segura da energia nuclear, a proteção das rotas de navegação marítima e o regresso das crianças deslocadas e dos civis detidos ilegalmente.

Algumas nações não assinaram o documento, incluindo o México, a Arábia Saudita e a Índia. A presidente da Suíça reconheceu a necessidade de a Rússia ser incluída nas futuras negociações e disse que a Carta das Nações Unidas deve ser respeitada.

Declaração do Brasil e da China

Os governos de Brasil e China negociaram no final de maio entendimentos sobre uma resolução para a guerra entre Rússia e Ucrânia, defendendo negociação política para que a paz seja alcançada.

O acordo firmado é um marco importante nas relações diplomáticas diante da continuidade da guerra. A avaliação do governo brasileiro é a de que a China, que também não participou do evento, é a única potência global com peso capaz de exercer influência sobre Moscou.

Brasil e China defendem a realização de uma conferência internacional que seja reconhecida tanto pela Rússia quanto pela Ucrânia, com participação igualitária de todos os países relevantes nas tratativas e uma discussão justa de todos os planos de paz.

A defesa de uma cúpula com os dois países em guerra é uma resposta à conferência que a Suíça realizou neste final de semana, que contou com a participação da Ucrânia, mas sem representação da Rússia.

“Somos gratos aos dois países por tentarem assumir o papel de mediadores do fim da guerra, mas gostaríamos de vê-los mais atuantes na ‘fórmula de paz da Ucrânia’. Para nós, seria mais proveitoso. Porque o Brasil e a China são países enormes, importantes e têm peso na política internacional e os vemos como parceiros neste processo de estabelecer paz, de acordo com a ‘fórmula de paz da Ucrânia’”, diz a vice-chanceler.

“O que não vimos nos seis pontos da declaração do Brasil e da China é a menção da soberania e integridade territorial da Ucrânia. E para nós isso é muito importante. Era algo que precisava ser mencionado de maneira clara. Apesar de os dois países já terem expressado de outras formas, nas Nações Unidas e em conversas bilaterais, por exemplo. Mas gostaríamos de ver isso de maneira mais clara na declaração conjunta”, afirma Iryna Borovets.

A proposta de paz ucraniana trata primordialmente de três pontos: segurança nuclear, segurança alimentar e aspectos humanitários, como troca de prisioneiros de guerra e libertação de adultos e crianças ucranianos que foram capturados pela Rússia.

“A vítima de agressão, e não o agressor, é quem deveria definir os termos futuros para a paz. E a Ucrânia tem direito moral a isso porque hostilidades de guerra estão acontecendo em territórios ucranianos e é a nossa população que está morrendo todos os dias, não apenas militares, mas civis e crianças”, diz.

“Esses são os pontos universais sobre os quais a comunidade internacional precisa se debruçar. Depois disso, haverá o processo de discussão do grande acordo por partes. Então, eventualmente, um dia, uma segunda conferência mundial pela paz deve acontecer onde poderemos convidar algum representante da Rússia”, afirma a vice-ministra das Relações Exteriores ucraniana.

Lula e Zelensky

O governo ucraniano defende que um novo encontro entre Lula e Volodymyr Zelensky aconteça. A avaliação da vice-chanceler é a de que o diálogo pessoal entre os líderes é crucial para a relação bilateral dos países.

“Nós realmente gostaríamos que um encontro entre os dois acontecesse. Os dois presidentes se encontraram no ano passado às margens da Assembleia Geral das Nações Unidas da ONU. Vamos trabalhar para que um encontro aconteça e vou repassar isso para os diplomatas brasileiros”, disse.

O governo suíço fez questão de convidar Lula durante um encontro presencial entre o chanceler do país, Ignacio Cassis, e o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, no dia 30 de abril. Zelensky também convidou Lula para participar da cúpula em uma entrevista à CNN, ocorrida no dia 18 de abril, em Kiev.

Futuro da guerra

Apesar das dificuldades enfrentadas pela Ucrânia ao longo dos últimos dois anos e meio, a vice-ministra de Relações Exteriores acredita que o país pode vencer a guerra se continuar a receber apoio militar de nações parceiras.

“Com a devida assistência militar, a Ucrânia é absolutamente capaz de vencer esta guerra. A despeito do aumento do ataque russo, estabilizamos a situação no norte de Kharkiv. É muito difícil, claro, nós não temos paridade de armas. Mas assim que tivermos, haverá um ponto de virada nesta guerra”, diz Iryna Borovets.

Em maio, a Casa Branca anunciou que os Estados Unidos estavam preparando um pacote de auxílio militar de US$ 400 milhões para a Ucrânia, retomando o ritmo habitual de fornecimento de armas para Kiev após a aprovação de um projeto de lei de US$ 95 bilhões pelo Congresso americano.

“Já estamos tendo muito sucesso, mas a situação é, sim, muito difícil. Estamos buscando o fornecimento adicional de armas com países parceiros porque, sem isso, com certeza, será muito difícil de derrotar um país tão grande e com tantos recursos como a Rússia”, afirma.

Independência ou morte ucraniana

A vice-ministra conclui a entrevista à CNN lembrando que, em sua visita ao Brasil, tomou conhecimento da existência do quadro “Grito do Ipiranga” ou “Proclamação da Independência”, pintado em 1888 por Pedro Américo.

“O guia do tour me disse que foi o famoso momento em que D. Pedro I disse independência ou morte. E eu fiquei: ‘meu Deus, para a Ucrânia o momento de independência ou morte está acontecendo agora'”, afirma.

“Eu gostaria de deixar essa mensagem ao presidente Lula, para as autoridades e população brasileira: para nós, ucranianos, esse é momento de independência ou morte e vamos lutar até o fim e, claro, gostaríamos de contar com seu apoio”, diz Iryna Borovets.