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As promessas de Trump e uma vitória para Putin: o saldo da reunião na Casa Branca para a guerra na Ucrânia
Sobre a mesa, o fim da guerra da Rússia contra a Ucrânia, que poderia ocorrer a partir de um possível encontro trilateral entre o americano, Zelensky e o presidente russo, Vladimir Putin

O presidente americano, Donald Trump, recebeu nesta segunda-feira (18) seu homólogo ucraniano Volodymyr Zelensky na Casa Branca para um encontro com mais sete líderes europeus.
Sobre a mesa, o fim da guerra da Rússia contra a Ucrânia, que poderia ocorrer a partir de um possível encontro trilateral entre o americano, Zelensky e o presidente russo, Vladimir Putin.
Trump afirmou que falaria com Putin ainda nesta segunda após a reunião, que ocorreu três dias depois que o republicano se encontrou com o russo no Alasca, sem que um acordo fosse firmado.
Mais amigável que no primeiro encontro, ocorrido em fevereiro e que terminou em tensão entre ambos, a reunião desta vez teve risadas, troca de cumprimentos e foto de líderes.
Acenando para as possibilidades, Trump prometeu garantias de segurança para a Ucrânia, mas não ficou claro de que forma essa proteção seria garantida, se liderada pela Otan, ou se poderá contar com outro envolvimento americano.
"Acredito que as nações europeias vão assumir grande parte do fardo", afirmou. "Vamos ajudá-las."
Trump disse não acreditar que um cessar-fogo seja necessário para o fim da guerra, em uma postura que indica uma reversão de sua posição anterior às conversas com Putin na sexta-feira no Alasca.
"Estrategicamente, isso [um cessar-fogo] pode ser uma desvantagem para um dos lados", disse Trump a jornalistas.
Isso é música para os ouvidos de Putin, que insiste há muito tempo que somente um acordo de paz abrangente nos termos de Moscou deve vir primeiro, seguido de um cessar-fogo.
O encontro se iniciou com uma breve conversa entre Zelensky e Trump no salão Oval, em frente às câmeras, passando depois para algumas perguntas de jornalistas antes deles se sentarem com mais sete líderes europeus.
Participaram da reunião, além de Trump e Zelensky, o chanceler alemão, Friedrich Merz, o presidente francês, Emmanuel Macron, o primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, o presidente da Finlândia, Alexander Stubb, o secretário-geral da Otan, Mark Rutte, e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.
Diante do clima hostil de sua última visita ao Salão Oval, em fevereiro, o presidente ucraniano se esforçou para ser cordial e conquistar seus anfitriões americanos.
Antes da reunião começar, ainda no salão Oval, Zelensky disse "obrigado" a Trump e ao governo americano seis vezes nos primeiros minutos em que falou.
Na visita anterior, Zelensky havia sido repreendido pelo vice-presidente JD Vance por supostamente não demonstrar gratidão suficiente pelo apoio dos EUA à Ucrânia durante a guerra.
Trump, por sua vez, agradeceu a Zelensky por estar nos EUA e disse que "progressos estão sendo feitos" para pôr fim à guerra entre a Rússia e a Ucrânia.
O presidente ucraniano entregou então uma carta de sua esposa, Olena Zelenska, para a primeira-dama americana, Melania Trump, agradecendo a ela por seus esforços empenhados em trazer de volta para casa as crianças ucranianas mantidas na Rússia.
Zelensky foi questionado por jornalistas sobre quais garantias deseja dos EUA. O líder ucraniano disse que precisa de "tudo", incluindo equipamentos e inteligência.
No início da conversa, houve um momento descontraído em que Zelensky foi elogiado por um repórter por sua vestimenta — o mesmo jornalista que criticou o traje de Zelensky em fevereiro.
Desta vez, Zelensky apareceu de terno escuro, em vez de seu tradicional uniforme militar, e tinha pronta uma piada quando foi questionado sobre o traje.
Depois de ouvir que estava "fabuloso", respondeu: "É o mesmo terno da outra vez", arrancando risadas dos jornalistas, de Trump e de outros presentes.
Como seriam as garantias de segurança à Ucrânia?
No cerne de qualquer futuro acordo de paz permanente entre a Ucrânia e a Rússia estará algum tipo de garantia de segurança visando dissuadir a Rússia de atacar a Ucrânia novamente.
Até agora, os EUA têm relutado em assumir qualquer compromisso nesse sentido, deixando a tarefa para a Grã-Bretanha e a França, com sua chamada "coalizão dos dispostos". Mas comentários da Casa Branca sugerem que os EUA podem agora estar preparados para ajudar.
Então, que forma isso poderia assumir? Existem, em linhas gerais, quatro possibilidades:
- Tropas no local. Esta é considerada a menos provável. Donald Trump vê esta guerra como um problema da Europa, algo que "nunca teria acontecido se ele estivesse no poder". Para ele, enviar tropas terrestres, mesmo em uma função de manutenção da paz, para um conflito que profundamente o desagrada, seria uma grande reviravolta;
- Patrulhas aéreas e marítimas. Isso é mais concebível. A Força Aérea dos EUA já opera voos de vigilância sobre o Mar Negro e outros lugares para monitorar o curso desta guerra. Mas é claro que há uma enorme diferença entre um voo de reconhecimento ou patrulha marítima sem confronto, e um que esteja preparado para se envolver em um confronto armado com uma potência nuclear como a Rússia;
- Inteligência. A inteligência aérea e por satélite dos EUA provou ser vital para ajudar a Ucrânia a conter o avanço das forças invasoras russas. No caso de um acordo de paz firmado por todas as partes, esta é uma área em que os EUA provavelmente ficariam felizes em ajudar;
- Logística. Qualquer que seja a forma que a "força de segurança" liderada pelo Reino Unido e pela França eventualmente adote no caso de um acordo de paz, ela precisará de muito apoio logístico. Embora o governo Trump tenha indicado que está buscando reduzir sua presença militar na Europa, esta é uma área não letal na qual Washington provavelmente ficaria feliz em ajudar.

Crédito,Alexander Drago/Reuters
Pouco antes do encontro, o presidente finlandês, Alexander Stubb, foi visto chegando à embaixada ucraniana em Washington, D.C. para uma "reunião preparatória" com Zelensky.
Enquanto Trump, Zelensky e os líderes europeus se preparavam para o encontro, Putin se ocupava ligando para seus homólogos em outros países.
O líder russo fez uma chamada para o presidente Lula, Cyril Ramaphosa, presidente da África do Sul, Narendra Modi, da Índia, e Emomali Rahmon, do Tajiquistão.
Segundo informações oficiais do Kremilin, Putin estava atualizando as outras lideranças sobre sua reunião no Alasca no fim de semana. Em nota, o Planalto afirmou que o líder russo avaliou o encontro como positivo.
"Após abordar os diversos temas discutidos com o presidente Trump, Putin reconheceu o envolvimento do Brasil com o Grupo de Amigos da Paz, iniciativa conjunta com a China", disse o governo russo em nota.

Crédito,Kevin Lamarque/Reuters
Acima de tudo, a presença dos líderes procurou fazer com que o presidente dos EUA veja a Ucrânia e a Europa como uma frente unida, além de garantir que Trump não seja influenciado por sua óbvia afinidade pessoal com Vladimir Putin a ceder às exigências dos russos.
Nesse ponto, algumas habilidades diplomáticas, como a do premiê britânico, Keir Starmer, foram testadas.
Trump gosta de Starmer e o ouve. E dentro de um mês Trump fará uma visita de Estado ao Reino Unido.
Ele também gosta de Mark Rutte, o secretário-geral da aliança militar Otan, e que às vezes é chamado de "Encantador de Trump".
O presidente americano parece ter menos apreço pelo presidente Macron. A Casa Branca criticou duramente sua intenção recente de reconhecer incondicionalmente um Estado palestino na próxima Assembleia Geral da ONU.
Para que um acordo de paz na Ucrânia tenha alguma chance de funcionar, alguém precisará ceder.
Líderes europeus têm dito frequentemente que as fronteiras internacionais não podem ser alteradas por força. Já Zelensky tem afirmado repetidamente que não abrirá mão de território e que a Constituição da Ucrânia proíbe isso.
Mas Putin quer a região do Donbas, onde suas forças já controlam cerca de 85% do território, e ele não tem absolutamente nenhuma intenção de devolver a Crimeia.
No entanto, como me disse certa vez a ex-primeira-ministra da Estônia e agora vice-presidente da Comissão Europeia e mais alta diplomata do bloco, Kaja Kallas, uma vitória da Ucrânia nesta guerra não precisa ser pautada exclusivamente pela reconquista de territórios ocupados.

Crédito,José Luis González/Reuters
Se a Ucrânia conseguir obter o tipo de garantia de segurança prevista pelo artigo 5 da Otan, suficiente para dissuadir qualquer futura agressão russa e salvaguardar sua independência como um Estado livre e soberano, isso já seria uma forma de vitória.
O Artigo 5 da Otan prevê que um ataque a um país-membro é considerado um ataque a todos.
Os EUA e a Rússia estariam discutindo agora uma proposta que, de forma geral, troca território ucraniano por garantias de segurança de que o país não precisará ceder mais à Rússia.
Mas ainda há muitas dúvidas.
A Ucrânia poderia aceitar um acordo que encerra a guerra, mas lhe custa território — especialmente quando tantos milhares de ucranianos morreram tentando protegê-las?
Se lhe for pedido que ceda os 30% restantes da região de Donetsk que a Rússia ainda não ocupou, isso deixaria o flanco oeste, em direção a Kiev, perigosamente exposto?
E quanto à tão alardeada "Coalizão dos Dispostos" de Starmer — o que eles fariam pela Ucrânia?
As conversas anteriores sobre o envio de dezenas de milhares de soldados para lutar na Ucrânia se dissiparam.
Agora, fala-se mais em "proteger os céus e os mares", ajudando a Ucrânia a reconstruir seu exército.
Mas mesmo que a paz se estabeleça no campo de batalha, ainda estamos em território perigoso.
Todos os especialistas militares com quem conversei acreditam que, no momento em que os combates cessarem, Putin reconstituirá seu exército e fabricará mais armas para estar em condições de, talvez em apenas três ou quatro anos, conquistar mais território.

Crédito,Kevin Lamarque/Reuters
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Donald Trump quer ver o fim da guerra na Ucrânia.
Ele já obteve alguns sucessos este ano ao encerrar — ou pelo menos interromper — guerras no Cáucaso, no Irã e, possivelmente, entre a Índia e o Paquistão. Mas, até agora, um acordo de paz com a Ucrânia não lhe foi alcançado e ele tem oscilado entre jogar a culpa em Moscou e Kiev.
Ele ouviu sua base de apoio do MAGA e sabe que há pouca disposição para o apoio contínuo dos EUA a uma guerra que a Ucrânia não pode vencer. Mas, em parte devido à sua clara amizade pessoal com Putin, ele parece muito relutante em aplicar o tipo de pressão econômica sobre a Rússia que seus críticos dizem ser necessária para forçar Putin a parar de lutar.
Já os líderes europeus, principalmente os presentes em Washington nesta segunda, estão dolorosamente cientes de que a segurança da Ucrânia está inextricavelmente ligada à segurança mais ampla da Europa.
Os líderes europeus se opõem firmemente à ideia de uma fronteira internacional ser alterada à força, mas é exatamente isso que está sendo cogitado após a cúpula do Alasca e as visitas do enviado presidencial dos EUA, Steve Witkoff, à Rússia.
Por isso, os líderes reunidos na Casa Branca foram a Washington para demonstrar unidade com a Ucrânia e para convencer Trump de que não deveria haver acordo sem o envolvimento de Kiev. Além disso, esperam tentar proteger o presidente Zelensky de ser coagido a aceitar alguma proposta impossível que sua própria Constituição nacional não o permitirá aceitar.
Por outro lado, a Rússia quer toda a Donbass, enquanto a Ucrânia não quer abrir mão dela.
E qual será a forma dessa "garantia de segurança no estilo do Artigo 5" que está sendo potencialmente oferecida à Ucrânia? Terá o apoio incondicional dos EUA ou apenas uma promessa de intenção vagamente formulada?
No fim das contas, tudo se resume a isto: se for possível fechar um acordo que ponha fim a esta guerra aqui e agora, como o Ocidente coletivamente garante que ela não se repita no futuro?