Política

Julgamento de Bolsonaro, dia 2: advogados de ex-presidente e generais questionam provas da trama golpista, delação de Cid e conduta de Moraes

A defesa de Bolsonaro afirmou que não há 'uma única prova' da participação do ex-presidente no 8 de janeiro e contestou a delação de Cid. O advogado disse ainda que pena de 30 anos 'não seria razoável' e pediu absolvição

PEDRO RIBEIRO/DA EDITORIA/COM G1 03/09/2025
Julgamento de Bolsonaro, dia 2: advogados de ex-presidente e generais questionam provas da trama golpista, delação de Cid e conduta de Moraes
A defesa de Bolsonaro na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) ficou a cargo dos advogados Celso Vilardi e Paulo Cunha Bueno | STF

O segundo dia do julgamento de Jair Bolsonaro e outros sete réus pela trama golpista teve apresentação das defesas do ex-presidente e de três generais.

A defesa de Bolsonaro na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) ficou a cargo dos advogados Celso Vilardi e Paulo Cunha Bueno.

  • Em suas argumentações, a defesa afirmou que Bolsonaro é inocente e que não há provas que o liguem aos atos golpistas, aos ataques de 8 de janeiro e ao plano de assassinar autoridades;
  • Segundo a defesa, Bolsonaro foi "dragado para esses fatos";
  • Disse também que a delação de Mauro Cid, ex-ajudante de Bolsonaro, não se sustenta. E que houve várias violações do acordo;
  • Afirmou que Cid mentiu e "não é confiável";
  • Que o processo andou muito rápido no STF, e que por isso a defesa não pôde analisar todos os elementos;
  • Afirmou que Bolsonaro não incitou movimentos golpistas nem atos violentos;
  • E que a denúncia fala de atos preparatórios e que não houve tentativa de golpe. Segundo a defesa, todas as medidas discutidas estavam previstas na Constituição;
  • A defesa pediu a absolvição de Bolsonaro e disse que uma pena de 30 anos de prisão não seria razoável.

Nesta quarta-feira (3), a sessão aconteceu apenas na parte da manhã e durou quase quatro horas.

O julgamento voltará só na próxima terça-feira (9), a partir das 9h, com o voto do relator, o ministro Alexandre de Moraes. O g1 vai transmitir ao vivo. ACOMPANHE AQUI

Veja o que disseram as defesas:

  1. Jair Bolsonaro, ex-presidente da República
  2. Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil
  3. Augusto Heleno, ex-ministro do GSI
  4. Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa

Jair Bolsonaro

O advogado de Bolsonaro afirmou que “não há uma única prova” que ligue o ex-presidente aos ataques de 8 de janeiro e que o seu cliente não atentou contra o estado democrático de direito. Ele também questionou a delação de Mauro Cid, disse que o ex-ajudante de ordens mudou versões e “não é confiável”.

“Essa minuta, esse depoimento, não há uma única prova que atrele o presidente [ex-presidente Bolsonaro] à Operação Luneta, ao Punhal Verde e Amarelo e ao 8 de janeiro. Nem o delator falou isso. Não há uma única prova”.

O defensor afirmou que as contradições do tenente-coronel são motivos para anulação da colaboração premiada.

"Ele [Cid] mudou a versão várias vezes. E isso não sou eu que estou dizendo, é, na verdade, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal, no último relatório de novembro, quando se disse que ele tinha inúmeras omissões e contradições."

Celso Vilardi, advogado de Bolsonaro, no segundo dia de julgamento no STF — Foto: Rosinei Coutinho/STF

Celso Vilardi, advogado de Bolsonaro, no segundo dia de julgamento no STF — Foto: Rosinei Coutinho/STF

Vilardi argumentou que Cid foi "dirigido" e "induzido" a implicar Bolsonaro em um golpe. Ele negou a participação do ex-presidente na tentativa de golpe e disse que todas as medidas discutidas pelo núcleo estavam previstas na Constituição.

Ele disse também que a defesa não teve acesso a provas utilizadas no processo e que não houve prazo suficiente para a atuação. Sobre esse ponto, Vilardi criticou a maneira como a PF disponibilizou as provas colhidas, que somavam mais de 70 terabytes de dados.

"Nós não tivemos o tempo que a Polícia Federal e o Ministério Público tiveram [para analisar as provas]. São bilhões de documentos. Eu não conheço a íntegra desse processo".

Sobre a minuta do golpe, a defesa tentou desqualificar o documento. A defesa negou que Bolsonaro tenha discutido com os comandantes da Marinha e do Exército uma ruptura democrática e disse que, depois de uma reunião de dezembro no Alvorada, o assunto se deu por encerrado.

O defensor de Bolsonaro voltou a sustentar que ele realizou a transição para o governo Lula, no final de 2022, sem criar obstáculos — o que, na visão da defesa, contraria a acusação de tentativa de golpe.

"A prova produzida pela defesa mostra que o presidente Bolsonaro determinou uma transição".

Uma prova disso, segundo Vilardi, é que os comandantes das Forças Armadas não estavam atendendo as ligações de José Múcio, nomeado ministro da Defesa por Lula no final de 2022, e Bolsonaro foi responsável por fazer uma ponte entre eles.

O advogado reclamou de cerceamento de defesa, pediu absolvição de Bolsonaro e afirmou que 30 anos de prisão para o ex-presidente não seria razoável.

🔎O que pesa contra Bolsonaro? A investigação da Polícia Federal coloca Bolsonaro como planejador, dirigente e executor dos atos que levariam ao golpe de Estado. Um dos trechos do relatório afirma: "Tinha plena consciência e participação ativa" nas ações do grupo.

🔎 Já a Procuradoria-Geral da República afirmou, em denúncia, que o ex-presidente liderou uma organização criminosa que praticou "atos lesivos" contra a ordem democrática e que estava baseada em um "projeto autoritário de poder".

Braga Netto

José Luís Oliveira Lima, advogado do general Walter Souza Braga Netto, foi o último a falar. Ele passou boa parte do seu tempo contestando a validade da delação de Mauro Cid, disse que “não fica em pé de jeito nenhum’. Para o advogado, Cid “mente descaradamente”.

"Eu sou um defensor do acordo de delação premiada. Mas ele tem que ser coerente, tem que ter provas".

Para ele, o documento tem "vícios".

"Não se pode condenar alguém com base em uma narrativa. Tem que se condenar por provas".

Ele também afirmou que o tenente-coronel do Exército foi pressionado a delatar, o que já foi negado pela própria defesa de Cid.

'O que tem contra Braga Netto é essa delação mentirosa e 8 prints adulterados', diz defesa

'O que tem contra Braga Netto é essa delação mentirosa e 8 prints adulterados', diz defesa

O advogado afirmou que o ex-ministro da Casa Civil e candidato a vice nas eleições presidenciais de 2022 é "inocente" e deve ser absolvido no julgamento sobre tentativa de golpe.

🔎 Braga Netto está preso no Rio de Janeiro sob a acusação de ter obstruído as investigações da trama golpista.

A exemplo da defesa dos demais réus, o advogado de Braga Netto reclamou da quantidade de documentos anexados ao processo e do pouco tempo para analisá-los. “É evidente que a defesa foi cerceada”, afirmou José Luis de Oliveira Lima.

Sobre a acusação que Braga Netto teria levado dinheiro para financiar o plano golpista, o advogado disse que Cid não foi assertivo sobre a data e as circunstâncias da entrega.

"É essa fala que vai pôr na cadeia o meu cliente por mais de 20 anos, 30 anos? É com essa mentira, com esse vai e volta que o meu cliente vai permanecer na cadeia e vai morrer no cárcere? Ele não consegue dizer onde foi, ele não consegue precisar a data".

🔎 O que pesa contra Braga Netto? A Procuradoria-Geral da República afirma que o general coordenou as ações mais violentas do grupo acusado de tramar um golpe de Estado após as eleições de 2022. E teve papel central na engrenagem golpista, mantendo contato direto com os manifestantes e articulando ações clandestinas com militares ligados ao governo.

Augusto Heleno

Primeiro a falar, o advogado de Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), questionou a conduta de Moraes em relação a testemunhas do caso e disse que um juiz não pode se tornar “protagonista do processo”.

“Nós temos uma postura ativa do ministro relator de investigar testemunhas. Por que o Ministério Público não fez isso? Qual é o papel do juiz julgador? Ou é o juiz inquisidor? O juiz não pode em hipótese alguma se tornar protagonista do processo."

Defesa do General Augusto Heleno questiona conduta de Alexandre de Moraes

Defesa do General Augusto Heleno questiona conduta de Alexandre de Moraes

Matheus Mayer Milanez negou a politização do GSI e disse que o general não pressionou militares por golpe.

"Que fique claro: nenhum militar foi procurado pelo general Heleno, nenhum militar foi pressionado [por ele]".

O advogado também questionou o uso da agenda de Heleno como prova, assim como negou a infiltração de agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

Outro ponto destacado pelo advogado foi o afastamento entre Heleno e Jair Bolsonaro. A defesa citou o depoimento do ex-assessor de comunicação do GSI afirmando que Heleno foi perdendo espaço no dia a dia do ex-presidente.

A defesa de Augusto Heleno afirmou que o fato de ele ser citado como integrante de um gabinete de crise após um eventual golpe de Estado não significa que ele tenha participado da elaboração dessa proposta.

🔎 O que pesa contra Augusto Heleno? Ex-ministro do GSI é acusado de integrar o núcleo estratégico da organização criminosa e de ter papel ativo nas articulações golpistas. A PGR cita uma agenda com teor golpista apreendida em sua casa como indício de envolvimento.

Paulo Sérgio Nogueira

O advogado Andrew Fernandes, que representa o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira, afirmou que seu cliente tentou demover Bolsonaro de tentativas golpistas.

"O general Paulo Sérgio tinha a responsabilidade de ser o ministro da Defesa e honrar a memória de Caxias e das Forças Armadas".

Segundo a defesa, as provas de que ele não fez parte da trama foram os ataques sofridos por outros membros das Forças Armadas.

"Ele sofreu ataques virtuais. No dia do gabinete de crise, cadê o general Paulo Sérgio? Ele não está lá. Tá mais que provado que o general é inocente".

General Paulo Sérgio tentou demover Bolsonaro de tentativas golpistas, diz defesa

General Paulo Sérgio tentou demover Bolsonaro de tentativas golpistas, diz defesa

Para o advogado, "está mais do que provado que o general Paulo Sérgio é inocente".

"Ele não fazia parte dessa organização criminosa".

O advogado de Paulo Sérgio afirmou ainda que foi "infeliz" a fala do general sobre a fiscalização das urnas eletrônicas ser para "inglês ver". Ele diz que a parceria entre o Ministério da Defesa e a Justiça Eleitoral sempre rendeu bons frutos, como o teste de integridade com biometria.

🔎 O que pesa contra Paulo Sérgio Nogueira? Ex-ministro da Defesa é acusado de ter buscado apoio das Forças Armadas para a tentativa de golpe e de ter papel ativo na articulação do núcleo crucial. A PGR aponta que ele participou de discussões para sustentar a ruptura institucional.